terça-feira, 9 de abril de 2013

Um estrangeiro no pago

Eis que hoje pela manhã, me deparei com minhas calças jeans e camisetas no armário, o que para meu espanto se encontravam em menor número do que minhas bombachas e lenços e camisas. Pois bem, que dia agradável estava, para num traje confortável de descanso, me encaminhar para a lida diária no laboratório. Lenço vermelho no pescoço, camisa arremangada, na cintura uma guiaca bem torneada, bombacha e alparagata. Há que sentir-se livre um gaúcho em seu próprio pago, pra bandear-se pra sua lida de cada dia, num aviamento de campo.
Estava eu esperando o ônibus, quando para minha estranheza, passam dois piazitos de calça larga e tropeçando nos fundilhos, com a cobertura de um boné de aba reta e, me olham dos pés a cabeça entre risos e cochichos. Tudo bem cada um tem seu estilo e sua filosofia e respeito isso.
Adentrei o onibus da linha Tancredo Neves/Campus e novamente me deparo com olhares dos mais variados possíveis, entre os quais, cito dois que me marcaram devido a intensidade. Um senhor, já idoso, bastante distinto, sentado sozinho me regalou um sorriso que fazia transparecer certa admiração, com a qual me enchi de disposição neste recém chegado dia. Logo após ao que procuro um assento, uma moça, cujo o banco ao lado estava vazio, de certa forma foi franzindo o cenho enquanto me aproximava, o que certamente desanimou-se de ocupar o referido assento ao seu lado.
A mocinha, com um pouco menos da minha idade, me parecia. Tinha lindos cabelos compridos, num tom de roxo que há tempos só via em carros de corrida. Além do tal cabelo, uma vestimenta que remonta uma linha de estilo, comportamento e cultura dita pelo senso comum como gótico.
Não me convém discutir o certo ou o errado e nem sequer rotular o próximo, pois me frustra que isso aconteça comigo.
Porém não posso fechar meus olhos para o que me ficou bastante claro nesta manhã incomum.
Parece que, para uma quantidade alarmante principalmente de jovens, quando distante do distante do dia 20 de setembro, a pilcha é apenas uma fantasia de gaúcho. Enquanto que, os estilos americanizados, o american's way of life toma conta principalmente através da dita moda, o boné de aba reta dos rappers é mais normal do que o meu chapéu de aba larga, enquanto que, a calça skinny é mais normal do que a minha bombacha, enquanto que, o cabelo roxo é mais normal do que o meu lenço vermelho, eu vejo que há algo de errado acontecendo.
Tu podes dizer que é apenas a forma como o fulano, o beltrano ou o ciclano se vestem, mas eu vejo que este é reflexo de um estado de espírito que se alastra e contamina os valores de uma sociedade mundial que esqueceu-se do gosto do conhecimento, do ser mais do que o aparentar e de honrar a família e a história que lhe precede.
Aquele único senhor, já de muitos invernos que, provalemente se viu ali vagando por sua mocidade, quando saia pilchadito pra ver a namorada, pra lidar na terra ou no lombo do cavalo, na minha visão, é o nosso MTG.
Resistindo ao tempo, às culturas corrosivas do consumismo e da vaidade, apegando-se à esperança de ver os jovens de hoje carregando um orgulho que também foi seu, não por um sentimento de saudada, mas na esperança de ver um futuro onde um gaúcho não seja visto, tal como um estrangeiro no próprio pago.

Texto de Rafael Silva, extraído do blog Timbre de Galo

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