A geada branqueava os campos,
E o vento gemia entre as paredes...
O sol não veio naquele dia,
Mas vieram muitas pessoas;
O velho cusquinho coleira...
Que todos as manhãs se enrolava,
Entre as botas do meu Pai,
Choramingava no silêncio do galpão;
O zaino velho da encilha,
Costeava as cercas do potreiro,
Talvez sentindo a falta dos bastos,
Talvez sentindo a ausência do amigo...
Meu Pai dormia sobre uma mesa,
Bem ali na sala da frente...
Com a sua roupa mais bonita;
Vi as mulheres chorando...
E as pessoas que chegavam,
Na minha inocência de criança,
Lembro quando a Mãe me disse:
Pois, agora ele é uma estrela,
Ele fora fazer uma casa nova,
E que um dia viria nos buscar!
Aquele dia foi muito triste!
Veio muita gente ver meu Pai...
Depois todo mundo foi embora,
E nós ficamos lá sozinhos...
Muitas vezes vi Mamãe chorando,
Muitas vezes vi Mamãe rezando,
E me ensinou em suas preces,
Contou-me várias estórias:
Das pessoas que viram anjos.
E que há um céu muito lindo,
Com muitas flores...e pássaros,
Onde um dia iremos nos encontrar,
Para seguirmos juntos a mesma vida;
Eu tinha muita saudade de meu Pai!
Para não ver a minha Mãe triste;
Uma noite, quando dormi...
Tinha uma roupa muito branca,
Levou-me pela mão por campos lindos,
Sangas, rios, flores, pássaros...
Tudo que minha Mãe tinha me contado;
Tinha um cavalo igual ao zaino velho,
E cusquinho coleira e brincalhão,
Que nem o que nós tínhamos aqui;
Sentamos numas pedras grandes,
Lá na costa de uma sanga...
E ele me contou coisas que nunca
Me deu beijos e abraços...
Porque antes Papai não abraçava...
Caminhamos por longas estradas...
Conversamos como dois amigos,
Eu ouvia atentamente seus conselhos,
Coisas que meu Pai nunca...
Mostrou-me o lugar onde morava,
E muitas pessoas que ali estavam...
E se foi caminhando tão longe,
Deixando-me ali chorando,
Com os olhos encharcados de lágrimas...
Sufocado no meu berço de criança;
Nunca falei isso para ninguém...
Daquele noite em diante...
Muitas vezes encontrei o meu Pai,
Sempre o mesmo sorriso...
Me soavam como conselhos,
Os braços abertos num afago de amigo,
A mão, sem calos... e aquela luz
Iluminando os meus passos;
Nunca mais fui para baixo da mesa,
Como eu fazia nos momentos de solidão;
Ou nas vezes em que ele tropeava,
Ficando dias longe da gente;
Nunca mais reclamei da sua ausência,
Pois entendi que há algo maior...
E que uma vida não acaba,
Pois até hoje, pelo vento,
Escuto o seu assobio mostrando-me,
Que ainda está junto de mim,
Caminhando do meu lado...
E iluminando os meus dias,
Com aquela luz tão branca,
Que só os anjos podem ter.
Cresci como crescem os meninos,
Tentando seguir os passos de seu Pai...
Muita gente não compreendia...
Quando ensinei outro cusquinho coleira,
A se enrolar nos meu pés...
E soltei o zaino velho para
Morrer num fundo de campo;
Porque um Pai vai embora?
Desde o dia em que compreendi,
Que Deus coloca ao nosso lado,
Para nos guiar pelas estradas da vida,
Sempre no caminho mais leve,
E que nos sustenta nas hora da dor;
Apenas parte pra um mundo novo,
Porque aqui onde vivemos,
Para um carinho de Pai e Filho!