sábado, 6 de outubro de 2012

Moisés Silveira de Menezes um poeta e tanto!

Moisés Silveira de Menezes, é um dos mais conceituados poetas do Rio Grande do Sul. Com uma vasta trajetória na poesia, vem participando dos maiores festivais da Poesia, sendo um dos mais recentes a 17ª Quadra da Sesmaria da Poesia Gaúcha de Osório. 
Além de Poeta e dos maiores, também é escritor e lançou recentemente mais um livro, uma homenagem a sua terra natal, Tupanciretã, já esgotando a 1ª  edição. 
Deixo aqui um dos poemas desse poeta que encanta pela beleza dos versos e o modo tão seu de escrever poesia, para os que andam procurando belas poesias à serem declamadas.

A FACA DE ADÃO LATORRE
Moisés Silveira de Menezes

A faca, lâmina, cabo
ferro e pau-ferro fundidos
a faca parte, reparte
corta, perfura, ponteia
passa, perpassa, transpassa.
A faca fere se é fera
o mando que ergue a mão
garra tenaz que a sustenta
fera feroz fere a faca
por isso ferro com fio
fio de vida, fio de morte
vida fugaz, fio da faca.

A faca de Adão Latorre
é faca na mão de negro
negro acuado, negro fera
negro ferido de açoite
tronco amarrado no tronco
marcas de algemas nas mãos
correntes nos pés descalços.
Tem olhos negros a faca
olhos de medo, assustados
noite nos olhos a faca
olhos de vida fugindo
pelo fio fino da faca.

A faca de Adão Latorre
traz marcas, marcas doridas
canaviais, minas, senzalas
África, banzo, savana
revoltos mares bravios
porão cheio, porão sujo
úmido, fétido, impuro.
Grilhões arrastando gente
ao rumo desconhecido
leilão, chicote, trabalho,
não cantavam tribos negras:
"Mérica, mérica, mérica".

A faca de Adão Latorre
é faca rumo à garganta
do branco que tem o mando
dono de tudo e de todos,
senhor de terras e almas.
É faca do oprimido
a mando de outro opressor
cumpre ordens negro velho
brancas ordens, ordens sujas
vai pra história negro Adão
bandido, degolador
feroz de faca na mão.

Um grande rio o Rio Grande
o Rio Negro rubro vivo,
rio de sangue negro ingrato,
anjo sinistro da morte.
A vida no fio da faca
vertendo sangue de irmãos,
irmãos de distintos lenços.
Guilhotina em movimento
estranho açougue de gente,
pergunta que não se cala:
A quem vingava Latorre
feroz de faca na mão?

Pedroso, o coronel branco
porque preso, presa fácil
negaceia, regateia
pensa até que a vida vale
vida de homem de bem
vida de homem valente
Vida opressora não vale
na mão de negro oprimido,
mas o mando é sempre branco,
no final, manda Pedroso:
"Então degola, degola
negro filho de uma puta."

A faca de Adão Latorre
cortou bem forte e bem fundo
a carne viva da história.
Inconsciente, rude e feia
a cicatriz do Rio Negro
desnuda a casta social
brandindo a lâmina crua
sangrando vidas e vozes.
Mas a pergunta não cala:
Cumprindo ordens de branco
a quem vingava Latorre
feroz de faca na mão?

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