Embaralho, corto eu mesmo e disponho as cartas na mesa, direto ao assunto: nos últimos dias tenho postado algumas opiniões de caráter estritamente pessoal acerca do momento atual do movimento artístico-poético-cultural dos festivais nativistas, fruto de várias conversas que venho tendo com amigos do meio. Fico feliz ao ver que o debate deixou o âmbito das conversas privadas e tomou espaço nos murais do facebook, inclusive de muitos que fazem parte da história deste movimento. Inicialmente, esclareço que não tenho absolutamente nada contra quem quer que seja: sempre que estive presente em algum evento, fui muito bem tratado por todos e creio ter correspondido com cortesia, respeito e amizade. Ainda, que a crítica séria não nasce, jamais, da inveja ou da frustração por não haver classificado obra neste ou naquele festival - aos 43 anos, acredito já ter superado há muito estes sentimentos menores -, mas do desejo de ver melhorada uma realidade que tem tudo para ser um dos mais importantes movimentos culturais da atualidade. Sempre gosto de citar o poeta e ensaísta Ezra Pound: “Ao mau crítico se conhece por criticar o artista, e não sua obra”. Ademais, não sou exatamente um neófito neste meio: participei de meu primeiro festival em 1988, aos 19 anos – o extinto (como tantos) Jacuí da Canção, de Charqueadas; no mesmo ano, ganhei meu primeiro troféu, vencendo a 4ª Tropeada (outro que foi extinto) de Livramento. No ano seguinte, ainda antes de completar 20 anos, tive a alegria de classificar uma música na (8ª? 9ª?) Tertúlia de Santa Maria. A faculdade de medicina e, ato contínuo, o início de uma vida profissional me afastaram dos festivais. Aos quais retornei em 2010, no 21º Grito de Jaguari. De lá pra cá, foram 14 participações (Gauderiada, Comparsa, Sentinela, Coxilha Negra, Casilha, entre outros), com três primeiros lugares (Canto sem Fronteira, Tertúlia e Coxilha). Esclareço – não que seja necessário – que jamais ganhei um centavo sequer, sempre abrindo mão dos valores em benefício dos parceiros. Nem mesmo para cobrir minhas despesas. Penso, portanto, que tenho alguma credibilidade e legitimidade para expor minha opinião.
O Rio Grande é um manancial inesgotável de talentos. Poetas, melodistas, intérpretes e instrumentistas que cantam e encantam com sua arte. Gurizada nova, inclusive, que, muitas vezes, acabam se frustrando ao terem as portas fechadas e desistem de seus sonhos. Quantos talentos estamos sufocando? Além destes, quantos grandes compositores da “velha guarda” estão, também, tendo portas fechadas e desistindo de enviar suas obras? Não posso acreditar que numa triagem onde tenham 500, 600 músicas inscritas (ou mais), apenas 10 ou 12 autores tenham trabalhos de qualidade. E, vejam bem, não estou questionando a qualidade destes; apenas afirmando que muitos outros também a tem. É claro que o trabalho de uma comissão julgadora é árduo – e escolher 12, 14, 16 ou 20 obras num universo de mais de 500 é muito difícil. Mas isso só corrobora o que escrevi acima: a quantidade de obras bem feitas com certeza vai além de 10 ou 12 autores. É possível, sim, avançar. Estabelecer não regras, mas critérios:
- Limitação na quantidade de músicas inscritas por autor, como muitos festivais já fazem; facilita, inclusive, o trabalho dos julgadores;
- Limitação em UMA obra classificada por autor, como já o fazem, por exemplo, a Tertúlia, a Coxilha e o Reponte;
- Limitação da quantidade de participações em comissões julgadoras por ano, estabelecendo um rodízio e dando oportunidade a todos com reconhecido saber artístico e, importante, imparcialidade; o Reponte dá ao público o direito de votar no júri da edição seguinte;
- Veto à participação, como concorrente, de artista contratado para show, como já acontece na Coxilha e, se não me engano, na Sentinela;
- Melhoria na ajuda de custo; aliás, o termo “ajuda” deveria ser substituído. Ninguém vai a festival para ser “ajudado”;
- Valorização dos nossos artistas locais: quantos eventos contratam, a valores exorbitantes, artistas de fora?
- Transparência nos critérios de avaliação: lembro que os festivais em sua maioria, senão em sua totalidade, são bancados por DINHEIRO PÚBLICO. Se exigimos transparência dos nossos políticos, por que não de quem gerencia o recurso destes eventos?
- Incentivo aos “festivais de inéditos e/ou autores não premiados”, como o Acampamento de Tapes.
Enfim, há muito a ser feito. Minha reflexão é um convite ao debate. Racional, respeitoso, sem ataques pessoais a indivíduos ou grupos. Até porque isso não cabe. E porque não é do meu feitio.
Quantas músicas dos festivais dos últimos anos acabaram se eternizando e virando clássicos? Quantas rodam nas nossas rádios? Quantas ouvimos nalgum assovio do público pelas ruas? Por onde andam os CDs dos festivais, que não se encontram nem em lojas especializadas? Quantos festivais assistimos morrer à míngua ultimamente? Quantos ainda veremos? Quantos eventos são feitos apenas com interesses politiqueiros e eleitorais?
Questões que deixo para debate.
Como diz meu amigo Leoncio Severo, me queiram bem que não custa nada.
E truco, chambão!!
Texto do facebook de Marcelo Davila
ALGUNS COMENTÁRIOS:
- Flávio Campos Sartori, Hermes Duran Duran, Cleiton Santos e outras 21 pessoas curtiram isso.
- Doris Santana Um ótimo tema para o Programa De campo - uma charla na boca da noite", não achas Leôncio Severo?
- Leonardo Sarturi Seria mesmo interessante um cruzamento entre os nomes que figuram nos júris e os premiados/classificados em um ano de festivais. Quem premiou aqui oara ser premiado lá?
- Gerson Soares Trujillo Perféito. Se não mudar este cenário, em alguns anos festival nativista vai ser conto de avô para neto, só ficarão na lembrança...
- Jairo Reis Festivais Marcelo Davila. Concordo com quase todos os aspectos que citaste, porém, na condição de produtor de festivais, te asseguro que algumas coisas não dependem somente da vontade de quem organiza. Este tema realmente merece um debate mais amplo. Coloco meu programa na Rádio Rural totalmente a disposição para realizarmos uma colocação de idéias. Interessados manifestem-se. Conto contigo, inclusive... Baita abraço.
- Bruno da Fronteira O amigo sabe que venho acompanhando todos esses debates e já manifestei minha opinião também... Nunca menosprezei quem classifica suas marcas. Muito pelo contrário, quem está lá, está por seus méritos. Porém creio que haja espaço para mais gente buena.A qualidade não está tão minguada que é necessário classificar mais de uma marca de um compositor. As coisas devem ser colocadas em seu devido lugar nos festivais, ou seja, primeiro a CULTURA GAÚCHA e depois o LUCRO e não o contrário!
- Caine Teixeira Garcia Posto comentário que fiz em meu perfil: Como todos já devem saber, concordo com o Marcelo Davilal ...e tantos outros que têm se manifestado acerca deste assunto... É necessário que tenhamos a maturidade devida para entendermos que, QUALQUER festival épúblico... não interessa quem bancou, quem organizou, quem colaborou... tendo em vista que o tema é inerente à cultura... ou pelo menos deveria...
Todo festival "reza" em seu regulamento que tem por objetivo a fomentação, o incentivo a criatividade de compositores e intérpretes com letras e músicas ligadas à temática regionalista do Rio Grande do Sul... que visa propiciar a revelação de novos talentos e facilitar a difusão de suas realizações artísticas, criar integração, etc, etc... (mais ou menos isso)...
E onde estão os novos talentos...? Eles estão sendo revelados nos últimos festivais?
Ou são velhos novos talentos? Ou novos velhos talentos?
É importante mesmo Marcelo, Giordan Gomes, Severino Moreira, Fabio, Geraldo, Rodrigo Mércio, Renato, José Atanásio ( e outros grande amigos que têm fomentado este assunto) que se registre que é necessária a mudança de sistema... quanto as pessoas, estas têm sua consciência e seu livre-arbítrio como norteadores e conselheiros...
Fácil é seguir o caminho alheio a tudo e a todos...
Difícil é ter opinião...
Fácil é achar que todo mundo está errado, quando para mim as coisas estão bem...
Difícil é apontar mazelas, ainda que este apontamento possa repercutir de forma negativa para quem o faz....
Fácil é criticar camaro amarelo, Luan Santana...
Difícil é assumir que os grandes deuses das músicas do Sul também fazem obras com meia letra e melodia, entupidas de gritos prá encher linguiça em festivais e em CD's...
Fácil é achar que se é melhor que outros tantos depois de se chegar em determinado lugar...ainda que este lugar, por vezes, seja lugar nenhum para muitos
Difícil é ter humildade para abrir picadas para os que podem ser até mesmo melhores que nós...
Minha isenção se embasa no fato de que não vivo de festivais...
E, espantem-se, tenho uma coisa meio sinistra prá dizer... e chocante: os festivais devem ser instrumentos culturais e não meio de vida...
E não sou contra que se tenha 500 eventos no ano para que a classe mostre seu trabalho, tenha lucro e tudo mais...só não façam por meio de festivais... PORQUE ESTÁ ERRADO!!! Simples assim...
REGRAS GERAIS... É O QUE SE PRECISA... - Jairo Reis Festivais Marcelo Davila, Caine Teixeira Garcia, Leonardo Sarturi, Bruno da Fronteira... Vou agendar uma data e ficarei aguardando a participação dos amigos. Pode ser na semana que vem mesmo... Alguns tem que vir pessoalmente, outros pode ser por telefone... Aceito sugestões de participantes...
- Bruno da Fronteira Pode contar comigo. Apesar do meu conhecimento ser ínfimo diante dos amigos (até porque sou meio "cria" do Marcelo Davila e do Caine Teixeira Garcia), participo com certeza... Acho que qualquer discussão que sirva para MELHORAR algo, é extremamente útil e proveitosa.
- Jairo Reis Festivais Faz 13 anos que estou na Rádio Rural, falando sobre festivais. Sempre ofereci espaço nos meus programas para estas discussões, mas infelizmente poucos aproveitaram as oportunidades... Agora o tema volta a pauta... o espaço continua à disposição, é só confirmar presenças... abraços...
- Jairo Reis Festivais So pra lembrar... a Rádio Rural AM 1120 fica em Porto Alegre e o programa Ronda dos Festivais vai ao ar de segunda a sexta, as 18h.... hoje já vou dar um toque no assunto... sintonizem através deste link http://aovivo.clicrbs.com.br/rs/radiorural/popup.html
- Leonardo Sarturi Jairo, ve pra mim se tem algum APP da rádio pra android, pois estou sem computador, só no tablet. E nao abre no navegador.
- Mário Eleú Mazzine Silva Concordo plenamente contigo Marcelo. Por veterano te digo que as "panelinhas" existem há muito tempo. Desde o início dos festivais. Em virtude disso, muitos compositores abandonaram os festivais.
- Hermes Duran Duran ....e assim e vai ser por muito tempo....ainda semana passada falei numa radio aqui na minha regiaõ sobre este assunto...cartaz marcadas....parceria...etc....
- Cleiton Santos A Vigília do Canto Gaúcho veta participação de artistas que fazem show como concorrentes. E/ou vice-versa...
- Cleiton Santos Como já estive dos dois lados, tanto como concorrente como coordenador de festival, vou dar algumas opiniões pontuais. O rumo do festival se define quando é escolhido o júri. Não necessariamente porque um amigo ajuda o outro, mas também porque há afinidades musicais e algumas músicas inéditas para festival transitam livremente entre os compositores, músicos, etc... fazendo com que sejam previamente conhecidas. A escolha dos jurados, repito, define o que será o festival, desde a linha - campeira, aberta, social, etc... Estes jurados são escolhidos por uma comissão organizadora que os escolhe. Muitas por amizade, afinidade, indicações, pois boa parte dos organizadores de festivais jamais comparecem a outros festivais para aprenderem, trocarem experiências, identificarem o que há de bom e pode (e deve) ser copiado e aplicado. Alguns organizadores de festivais se restringem a participar do seu próprio e sequer consultam um músico, um compositor, sobre as suas demandas. Daí surgem os festivais que pagam em cheque nominal, cruzado, no nome de um autor que sequer está presente, festivais de três a quatro dias com ajuda de custo de mil reais, entre outras bandalhas. Os organizadores de um festival e SEUS JURADOS, DEVEM LER E TER CONHECIMENTO DO REGULAMENTO DO FESTIVAL. Na fase local da Vigília, por exemplo, o regulamento OBRIGA que ou autoria da música ou autoria da melodia seja INTEGRALMENTE de autores residentes ou nascidos em Cachoeira do Sul. Mas, já vimos músicas lá que eram 50% melodia local, 50% de fora e 100% da letra de fora. Os organizadores informaram que não sabiam... E já vi festivais onde a fase local tinha apenas o nome de alguém da cidade para esquentar, pois era integralmente de concorrentes de municípios vizinhos. Finalizando, e concordando quase que integralmente com o que disse o Marcelo, um festival que remunera (sim, pois boa parte dos músicos vivem disso) a composição entre R$ 500 e R$ 1 mil, sequer deveria receber inscrição, pois é um abuso, um acinte, obrigar um compositor ou músico pagar para tocar mediante o repasse dos direitos de sua obra, sobre a qual deveria ter DIREITOS AUTORAIS. Ajuda de custo, se preferem chamar assim, deveria cobrir ao menos o custo dos músicos e compositores para estarem no festival. O "ganho" seriam as premiações. Mas, uma ajuda de custo de até R$ 1,5 mil num festival de 2 dias, não paga alimentação, transporte e hospedagem para 6 a 8, as vezes 10 pessoas. Então, não se iludam. Os organizadores de festival chegaram a formar uma entidade, na qual deveriam se organizar não apenas para captar recursos, mas também trocar experiências. Foi esvaziado, até porque boa parte deles são dependentes da Prefeitura, cujos responsáveis os prefeitos mudam mais do que de cuecas.
- Cleiton Santos Escrevi na corrida e fui dar um enter para abrir parágrafo e acabei remetendo. Como o horário de almoço acabou, por favor relevem os erros de grafia, concordância, repetições, etc...
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