Há muito tempo venho batendo na mesma tecla. Como faço parte do Galpão da Poesia Crioula de Santa Maria, venho assistindo os declamadores da região e vejo, infelizmente, que ainda falta um trabalho mais aprimorado em questão de poesia.
Nesse tempo em que assisti alguns eventos de declamação, em todos eles vejo os mesmos defeitos e vejo também que falta humildade de alguns declamadores, tanto masculino quanto feminino, para aperfeiçoar esse momento tão importante que é a declamação.
Pois bem, a poesia é um momento solitário, ou seja, é tu e o poema, não importa nada mais. Um bom amadrinhador ajuda, mas não muda resultado. O que pode fazer tu ires bem numa declamação são:
1º - A escolha de um poema que te identifique, que tu entendas, que tenha uma linguagem forte, expressiva e se der na 1ª pessoa...Eu.
2º - Não decores um poema, sem antes entender sua linguagem, sua mensagem e o tempo em que ele foi feito(Tem poemas que hoje, não chamam mais a atenção, por ex.: Sou prendinha... Sou gauchinha... etc...)Essa linguagem em outros tempo, foi o máximo, hoje, cansou!
3º - Cuide a pontuação. Peguei cópia de poesia para avaliar que não tinha pontuação. Um poema sem pontuação não existe. Como todos os poemas tem pontuação, copie, grave, decore, com sua pontuação. Se tem vírgula, é porque quer um tempo... Se tem ponto e vírgula, o tempo é maior... Se tem interrogação, é porque é uma pergunta... e assim por diante.
4º - Entonação de voz - Não precisa chorar, mas se fala de dor, a expressão facial e a voz pode ser de dor. Se fala de alegria, a expressão facial e a voz pode ser de alegria... Por isso a importância de decorar um poema, já estudando todas as suas características;
5º - Cuidar o exagero dos gestos, não precisa apontar tudo. Tem gente que parece uma borboleta se sacudindo para fazer os gestos. Tudo que é exagerado é errado.
6º - Cuidado! tem poemas muitos extensos e com uma linguagem que ninguém entende, uma verdadeira viagem. O Maior de todos os Poetas Gaúchos, e hoje esquecidos pelos declamadores, chama-se Jaime Caeteno Braum e sua linguagem é simples, objetiva e poética. Escrever metáforas, ou essas viagens de palavras, para mim isso não é poesia.
7º - O mais importante, tu tens que te convencer, primeiro a ti que és declamador e depois aos que te julgam. Tem gente dizendo versos, porque isso traz algum "status" ou porque gosta, mas quem sabe estudar um pouco a poesia não iria te ajudar.
Pessoal, humildade e água fresca, não fazem mal a ninguém. Tenha a humildade de procurar poemas interessantes, poéticos, expressivos, de linguagem acessível. Toda poesia tem uma, duas ou até três partes fortes, tente encontrar essa parte forte do poema, que te dê gana, ênfase para dar o melhor de ti. E cuide a voz, tem gente declamando quase chorando. Não há necessidade de mudar de voz para declamar, tu podes cair no ridículo... tente se espelhar, olhar, assistir e até conversar com declamadores mais experientes e vencedores. Se eles estão sendo premiados é porque tem algo diferente.
No mais, fico feliz de saber que tanta gente está indo para o lado da poesia, mas com cuidado. Fica aqui a minha dica. E se alguém quiser conhecer mais poesias e quer alguma opinião minha, é só entrar em contato.
Grácias a todos. Essa é minha opinião.
Vou deixar uma poesia para todos:
O PAI NAS FOTOGRAFIAS
Apparício Silva Rillo
Revejo as fotografias de família
- um vezo antigo de exorcização,
caça do tempo perdido
como nos romances franceses de Marcel.
A tarde é úmida sob o gris das nuvens
e é em tardes assim que me descubro
nos perfis esmaecidos em cinzentos
dos que, antes de mim,
sentaram à mesa de jantar de onde vim:
o pão, o vinho,
os talheres em cruz.
Na mais antiga das fotografias,
meu avô paterno:
sua barba de imperador
de um condado de léguas na Fronteira
onde vacas pariam,
onde pastavam bois e voavam cavalos.
A seu lado
minha avó dona Chica e seus traços de bugra
(um desenho do álbum de Debret).
Ao seu redor crianças:
meu pai, minhas tias e tios.
Ao todo onze do sangue desse par,
solenes
como estátuas de praça,
olhando firmes
para o ponto de fuga de meus olhos.
Na mais antiga das fotografias
há um tempo parado
como um vagão sobre o trilho
sem a locomotiva que o tracione.
Debruns de traço leve a emoldura-la
E um timbre onde se lê:
"Bartolomé Sambolino, Artista Photografo".
Dela,
pelo tempo nos relógios de algibeira,
cresceu meu pai noutras fotografias.
Nesta que vejo,
moço e estudante entre colegas.
Noutra,
(para noiva Lélia)
de perfil:
o crespo ondeado dos cabelos
a morrer na gola alta da casaca;
o ângulo do nariz sobre o traço da boca;
os óculos de lentes redondas, a haste fina
cortando a costeleta antes da orelha.
E outras fotografias.
A terceira e a quarta,
a undécima delas - muitas!...
Em todas, a boca severa
o lábio junto ao lábio,
o avesso do riso...
Eis, e de repente,
a fotografia do ano antes da morte;
o câncer por detrás da boca amarga,
os olhos em contida angústia me fitando.
(De todas,
a que me dói como um carvão aceso
na palma desta mão crucificada
que a sustenta como a um Cristo de carvão).
Ajusto o foco...
Dimensiono as lentes...
Fotografo a lembrança...
Nunca me lembro de meu pai sorrindo.
Se procuro acreditar que riu um dia
não terá sido nas fotografias!...
Os documentos são estes que revejo
na tarde em descendência para o chumbo.
Neles,
neles todos,
a tua boca amarga, pai, a esconder os dentes
que são o piano onde o riso tamborila
quando de adentro o coração comanda,
a música e a dança!
Não tenho ouvidos para ouvir-te o riso
nem olhos de memória para tê-lo.
E isso dói, pai...
É brasa viva na mão crucificada
- o fogo e sua roca de trabalho.
Sim, eu sei que tudo isso,
todo esse discurso de catarse,
poderia caber num só conceito:
- meu pai não ria nas fotografias
e eu não tenho memória de seu riso.
Mas às vezes, pai,
é preciso derramar esta angústia, de dentro!...
Vou deixar uma poesia para todos:
O PAI NAS FOTOGRAFIAS
Apparício Silva Rillo
Revejo as fotografias de família
- um vezo antigo de exorcização,
caça do tempo perdido
como nos romances franceses de Marcel.
A tarde é úmida sob o gris das nuvens
e é em tardes assim que me descubro
nos perfis esmaecidos em cinzentos
dos que, antes de mim,
sentaram à mesa de jantar de onde vim:
o pão, o vinho,
os talheres em cruz.
Na mais antiga das fotografias,
meu avô paterno:
sua barba de imperador
de um condado de léguas na Fronteira
onde vacas pariam,
onde pastavam bois e voavam cavalos.
A seu lado
minha avó dona Chica e seus traços de bugra
(um desenho do álbum de Debret).
Ao seu redor crianças:
meu pai, minhas tias e tios.
Ao todo onze do sangue desse par,
solenes
como estátuas de praça,
olhando firmes
para o ponto de fuga de meus olhos.
Na mais antiga das fotografias
há um tempo parado
como um vagão sobre o trilho
sem a locomotiva que o tracione.
Debruns de traço leve a emoldura-la
E um timbre onde se lê:
"Bartolomé Sambolino, Artista Photografo".
Dela,
pelo tempo nos relógios de algibeira,
cresceu meu pai noutras fotografias.
Nesta que vejo,
moço e estudante entre colegas.
Noutra,
(para noiva Lélia)
de perfil:
o crespo ondeado dos cabelos
a morrer na gola alta da casaca;
o ângulo do nariz sobre o traço da boca;
os óculos de lentes redondas, a haste fina
cortando a costeleta antes da orelha.
E outras fotografias.
A terceira e a quarta,
a undécima delas - muitas!...
Em todas, a boca severa
o lábio junto ao lábio,
o avesso do riso...
Eis, e de repente,
a fotografia do ano antes da morte;
o câncer por detrás da boca amarga,
os olhos em contida angústia me fitando.
(De todas,
a que me dói como um carvão aceso
na palma desta mão crucificada
que a sustenta como a um Cristo de carvão).
Ajusto o foco...
Dimensiono as lentes...
Fotografo a lembrança...
Nunca me lembro de meu pai sorrindo.
Se procuro acreditar que riu um dia
não terá sido nas fotografias!...
Os documentos são estes que revejo
na tarde em descendência para o chumbo.
Neles,
neles todos,
a tua boca amarga, pai, a esconder os dentes
que são o piano onde o riso tamborila
quando de adentro o coração comanda,
a música e a dança!
Não tenho ouvidos para ouvir-te o riso
nem olhos de memória para tê-lo.
E isso dói, pai...
É brasa viva na mão crucificada
- o fogo e sua roca de trabalho.
Sim, eu sei que tudo isso,
todo esse discurso de catarse,
poderia caber num só conceito:
- meu pai não ria nas fotografias
e eu não tenho memória de seu riso.
Mas às vezes, pai,
é preciso derramar esta angústia, de dentro!...
Sem comentários:
Enviar um comentário