segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Rio Grande que não morre - Tripeirismo

TROPEADA AO 29º RODEIO INTERNACIONAL DA VACARIA
Participantes: Hélio Tropeiro e Mauri José Fuhr
O Rio Grande conhecido no século 18 era um mundo de gado solto no campo - vacas, éguas, mulas. Tropeiros vieram em busca dessas “vacadas”, “eguadas” e “muladas” para garantir o sustento das “metrópoles” de então e o trabalho nas minas, engenhos e cafezais. Começaram procurando passos de rio e pouco a pouco foram riscando trilhas no topo da Serra Gaúcha – era a Vacaria dos Pinhais, nos Campos de Cima da Serra; acomodavam-se para dormir nos POUSOS, marcavam ponto e comiam à sombra nas SESTEADAS, mascateavam em BODEGAS ao longo da cada JORNADA.
Esta história, escrita a pata de mula e cavalo, desenhou o mapa do Rio Grande do Sul e integrou o estado ao resto do Brasil – as cidades, quase todas, foram surgindo na margem desses caminhos tropeiros ainda hoje visíveis, e que se abrem agora aos novos desbravadores.
HÉLIO PEREIRA, agricultor e neto de tropeiro, residente em Maquiné, busca resgatar esta história, com mais de 9.000 km percorridos em suas tropeadas; por onde passa faz anotações e registra tudo em livro, tendo matérias e depoimentos escritos para muitas publicações; a ida a Vacaria também teve como objetivo resgatar a memória de sua bisavó que viveu e possivelmente esteja sepultada naquela cidade; leva nas bruacas cartas de Entidades Municipais e Estaduais da cidade de Maquiné para serem entregues no final da jornada em Vacaria, além de bom estoque de rapadura para brindar as famílias que abrigaram os Tropeiros em suas moradas.
Seu companheiro de jornada é o tradicionalista MAURI JOSÉ FUHR, Oficial da Reserva da Brigada Militar, residente em Capão da Canoa; os dois já realizaram tropeadas a São Francisco de Paula, Caará e agora Vacaria; viajam sem maior estrutura de apoio, somente os cavalos de montaria e a mula de cargueiro, dependendo da solidariedade dos proprietários para o pouso e somente uma boa sombra para a sesteada e almoço, a maioria das vezes pão, lingüiça, farofa e rapadura ( trago de canha antes e um vinho para relaxar).
A jornada começou em Maquiné as 15 hs do dia 20 de janeiro, com destino ao 29º Rodeio Internacional de Vacaria, com percurso de aproximadamente 270 Km em 8 dias de viagem; estradas de chão batido, atalhos por campos e fazendas, travessia de rios e asfalto somente próximo a Bom Jesus; muita expectativa, sem carro de apoio, dois cavalos e o cargueiro levando os pertences e consumo nas bruacas. VACARIA, PORQUE VACARIA¿ QUAL A ORIGEM¿ VAMOS DESCOBRIR.
O primeiro pouso foi na localidade de CERRITO onde foram recebidos na propriedade de Pedro Rech e sua esposa Helena; “OH! DE CASA”; nota-se a partir daí a influência da música serrana, especialmente dos Bertussi; chegaram ao entardecer, chimarrão, jantar campeiro, pernoite, chimarrão na madrugada e um café da manhã, prontos então para a nova jornada; muita hospitalidade, histórias, conversas, novas amizades e ótimas lembranças.
“...e agora tomando um chimarrão e logo um café para dar uma força no peito e agüentar a viagem. Desejo uma boa cavalgada ida e volta com a proteção de Deus e Maria Nossa Mãe Protetora. Obrigado meu Pai Eterno por esse dia importante de minha vida e de minha esposa e filhos...” depoimento de Pedro Edemar Rech.
Dia 21, uma das etapas mais difíceis do trajeto, transpor a Serra do Umbu até Rincão dos Groeff, já em São Francisco de Paula; parte da serra os cavaleiros apearam e foram caminhando para poupar as montarias que ainda não estavam alinhadas no ritmo da tropeada; sesteada num belo capão da mato e o almoço pão, lingüiça e rapadura; antes de partir foram surpreendidos pela mudança do tempo; mal conseguiram encilhar e veio uma bomba d’água guasqueada que não os impediu de seguir; cavalgaram por horas em São Chico e ao entardecer buscaram pouso numa Fazenda com vasta plantação de hortigranjeiros, propriedade de Miguel Zaronski, de Maquiné; de imediato se nota a diferença de paisagem dos campos para a agricultura; pouso no alojamento dos peões da empresa que fornece produtos para as maiores redes do estado.
Dia 22, os cavalos já alinhados e pedindo rédeas, foram pela Estrada do Cerrito, cruzando o asfalto que liga São Chico e Tainhas; chegaram na Fazenda Canela onde termina a estrada; atalhos por campos e fazendas e no percurso entrevista via celular com a Rádio Osório; pela imensidão dos campos acabaram se perdendo aumentando o trajeto em alguns km mas conseguiram informações na Fazenda Arroio do Sabugueiro em Lomba Chata, através do proprietário José Luiz Dutra, 50 anos nativo da região, índio campeiro, rude e hospitaleiro que mostrou o norte novamente; Lomba Chata, Vale do Cedro, atravessando o Rota do Sol, novamente pelos campos em direção ao Passo da Ilha, divisa de São Chico, Cambará do Sul e Jaquirana; um presente da natureza, cachoeiras lindas que deixam no ar um ruído mágico das águas açoitando as pedras; um camping bem organizado; já ao entardecer atravessaram a passo o Rio Tainhas, pela água; mistura de medo e perigo vencidas pela maravilha da natureza; a salientar que este trajeto desde a Estrada do Cerrito até travessia do Rio Tainhas era utilizada na rota dos tropeiros que faziam o trajeto Viamão-Sorocaba conhecida como Caminho de Cristóvão Pereira, partindo das proximidades de Palmares a partir de 1734; aportaram em Jaquirana e o tempo preparando nova chuvarada; apressaram o passo e buscaram pouso na Fazenda do Sr Gildo Pereira; embora com a família reunida, filhas e netos, recebeu com toda fidalguia, de braços abertos.
Dia 23 após o café com a família Pereira saíram em direção à cidade de Jaquirana; ao meio dia sesteada na localidade de Tres Irmãos; numa bela sombra na beira da estrada foram recebidos pelo Sr João Nelson Ayude, de origem Sirio-Libanesa, salientando a diversidade de cultura etnias e costumes; à tarde chegaram na cidade, chamando de imediato a atenção pela cultura madeireira; um verdadeiro paraíso natural com belíssimas paisagens, rios, cascatas, área de lazer, campos e trilhas ecológicas; um verdadeiro culto ao Tropeirismo tendo um evento tradicional denominada SESTEADA que busca preservar a história dos Tropeiros; em Jaquirana ficaram instalados no Parque de Rodeios Dico Borges; à noite foram recepcionados na Pousada Vista Alegre através da Srª Ludimar; pouso nos pelegos no próprio parque.
O dia 24 foi destinado ao descanso, permaneceram no parque; pela manhã café de cambona e ao meio dia um suculento churrasco preparado pelo Hélio; com a companhia do Zelador do Parque Sr Antonio, receberam visitas da comunidade, o amigo Assis (Lobuno), Gilmar, que deu assistência aos animais e a Srª Ludimar, apaixonada pelas causas tropeiras e que coordena a SESTEADA, evento tradicional no município; à noite, muita chuva, outro jantar na Pousada com a presença de amigos e familiares.
“... que no lombo de seus cavalos vem resgatando a nossa cultura tropeira; pedimos ao Patrão do Universo que derrame suas bênçãos aos tropeiros, que sua tropeada seja abençoada e tenham muita saúde, paz para prosseguir sempre em suas cavalgadas, pois é um gaúcho dos quatro lados, de bombacha, bota e espora, sempre no lombo de um cavalo por estes rincões a fora...” Jorge e Ludimar, proprietários da Pousada Vista Alegre.
No dia 25 encilharam e partiram rumo a Bom Jesus; na passagem foram recebidos na Prefeitura de Jaquirana pelo Secretário de Turismo; a comunidade reuniu-se em torno dos tropeiros buscando informações sobre a jornada; passaram no Morro do Cristo Redentor, no centro da cidade, que segundo a história foi palco de uma batalha na Revolução de 1923, entre Maragatos e Chimangos; estavam ali os Tropeiros vivenciando a história gaúcha; em estrada de difícil trânsito desceram a Serra do Rio das Antas, atravessaram o rio na Ponte do Caraúno e subiram novamente a serra; trajeto muito cansativo, muitas pedras e chuva novamente; pediram apoio na propriedade de Odon Santos Velho; bastava uma sombra para desencilhar e sestear mas foram brindados com a abertura da residência onde almoçaram e descansaram; na saída foram brindados com o doce de GILA, fruta típica da região dos Campos de Cima da Serra, que foi trazida pelos tropeiros; pela tarde Odom encilhou seu cavalo e fez costado aos tropeiros por um bom tempo até se despedirem;
“...a felicidade é um bem que deve ser multiplicada e dividida com os companheiros; sejam sempre bem vindos a nossa morada. A gente aprende muito nessas nossas andanças; esperamos que sigam em paz e que o pai do céu lhes acompanhe...” depoimento de Cezira e Odon Santos Velho
Ainda no dia 25 pela tardinha chegaram na Fazenda Santa Luiza do Carauno, já em Bom Jesus, onde conseguiram pouso; proprietário Chico Dutra, homem campeiro, hospitaleiro e culto, com vasto conhecimento da história gaúcha; apaixonado pelas lides tropeiras; à noite os tropeiros brindaram o amigo Chico com um carreteiro, com a sobra do churrasco; muitas histórias até o inicio da madrugada; notou-se a mudança da temperatura pois esfriou e muito, o que é normal naquela região; pela manhã foram brindados com o “CAMARGO”, bebida tradicional na serra, café forte e quente com o leite tirado na hora pelo próprio Chico; prontos para seguir adiante.
“...ao cair da tarde chegam a Santa Luiza do Carauno, dois cavaleiros com seu cargueiro, Hélio e Mauri, de novo lembrança dos tempos de guri! É uma satisfação mui grata receber e conviver com pessoas como os senhores, com a mesma lealdade, caráter e lhaneza de trato, como é característica de todos os gaúchos que prezam a cultura dos pagos; ...a vida transcorre passo a passo no tranco das mulas ao longo dos caminhos e vão mirando campos, arroios, matos, gentes, gado, fazendas; fazendo amigos para a vida...” depoimento de Chico Dutra e esposa Cenira
No dia 26 saíram em direção a cidade de Bom Jesus; apenas 3 Km o asfalto da BR 285, no Km 49; aproximadamente 200 Km e pela primeira vez enfrentaram o asfalto; chama a atenção a cultura da maçã; chegaram a Bom Jesus e foram recebidos pelo Diretor de Turismo Jaziel de Aguiar Pereira, no Centro de Informações Turisticas; terra do Tropeirismo que realiza com sucesso o SENATRO (Seminário Nacional do Tropeirismo), do qual o Hélio Tropeiro é palestrante; o município foi caminho dos antigos tropeiros e os corredores de pedra por onde passavam tropas de mulas continuam preservados e hoje são importantes atrativos turísticos; a sesteada foi numa bela sombra, na praça ao lado da Prefeitura Municipal; foram recebidos na Prefeitura Municipal pelo Vice-Prefeito Ajadil Barbosa de Almeida, Prefeito em exercício; concederam entrevista na Radio Aparados da Serra ao Repórter Nilson Spanholy; a tarde continuou a jornada, agora rumo a Vacaria; o pouso foi na Fazenda Emiliano Cilon Silveira, onde ocorreu encontro de cavalgadas vinda de Osório e Santo Antonio da Patrulha; uma recepção digna da grandiosidade da jornada.
“...recebi em meu gabinete os tropeiros Hélio e Mauri, os quais parabenizo pela iniciativa em resgatar a cultura dos tropeiros, bem como valorizar a nossa cultura através de uma cavalgada, demonstrando a altivez, a honra, levando por estes pagos a nossa tradição...” depoimento de Ajadil Barbosa de Almeida, Prefeito em Exercício de Bom Jesus.
No dia 27 ultima etapa da jornada pela BR 285; o pouso ocorreu na Fazenda Júlio Kuller, próximo a Vacaria onde se encontraram todas as cavalgadas vindas do Rincão Gaúcho e de Santa Catarina; foram recepcionados pela Patronagem do CTG Porteira do Rio Grande com um churrasco de confraternização e a entrega de troféus as entidades participantes
No dia 28, após café da manhã todas as cavalgadas participantes dirigiram-se a Vacaria, onde ocorreu desfile pelas ruas da cidade e após a abertura do 29º Rodeio Internacional no Parque de Rodeios Nikanor Kramer da Luz, com a presença do Sr Governador do Estado; ficaram instalados junto as mangueiras do gado utilizado nas provas, numa gentil concessão do Patrão da Campeira Sr Corso e do Coordenador do Gado Sr Dinarte; concederam entrevistas a Radio Esmeralda, Jornal o Tropeiro, Jornal Zero Hora e TV Soluções; a salientar a estrutura do Parque de Rodeios que tem atividades campeiras as 24 horas do dia bem como o nível dos laçadores e ginetes participantes e o público presente; na abertura do rodeio, somente na Taça Cidade havia 230 duplas inscritas; os Tropeiros usufruíram e participaram por dois dias da programação do rodeio, iniciando então os preparativos para o retorno a Maquiné e Capão da Canoa, o que ocorreu no dia 30 de janeiro, tendo sido utilizado caminhão boiadeiro para o transporte.
Hélio e Mauri foram convidados e estão planejando participar em Abril do Seminário Nacional de Tropeirismo em Bom Jesus e da SESTEADA em Jaquirana, sendo que a jornada será novamente a pata de mula e cavalo.

Fonte: Face Tropeirismo - Rastro de Mula

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