sábado, 12 de setembro de 2015

Mauro Moraes conta a história da música "Milonga Abaixo de Mau Tempo"


 Zero Hora começa uma série de reportagens onde conta a história de quatro músicas marcantes do cancioneiro gaúcho, destrinchando letras e melodias a partir do relatos de autores e intérpretes. Hoje
Mauro Moraes conta a história da música "Milonga Abaixo de Mau Tempo"


Ao receber a letra de Milonga Abaixo de Mau Tempo das mãos de Mauro Moraes, já com olhos marejados, o cantor José Claudio Machado indagou o compositor:

— Tu tens noção do que fizeste?

— Fiz uma canção para ti — respondeu Mauro, inocentemente.

— Não. Tu fizeste um clássico — devolveu José Claudio.

A conversa que remonta a algum lugar dos anos 1980 rompeu gerações. Hoje, gaúcho nenhum é capaz de questionar a sentença do intérprete, morto em 2011.


A música nasceu a partir da história de vida do próprio José Claudio Machado, que foi tropeiro até a adolescência, transportando gado de um campo a outro Rio Grande adentro. Além da admiração pelo ímpeto na voz e na defesa da tradição, Mauro Moraes tinha curiosidade de entender o antigo ofício do amigo.
— Nessas andanças pelos festivais e shows, certa vez perguntei ao Zé: "E se chove uma semana inteira com a bicharada no campo?". Ele respondeu: "A gente leva (a tropa) para um capão de mato para abrigá-la. Dá um jeito, mas é complicado de lidar. Porém, o que mais dói é a saudade que a gente tem de casa" — recorda Moraes, que escreveu Milonga Abaixo de Mau Tempo e ofereceu ao parceiro.

Também compositor de mão cheia e rigoroso em seu repertório, Machado sentiu um "encantamento" em torno da canção, conforme Moraes. Tomou a letra como se fosse dele e a eternizou com seu canto como forma de retribuição ao autor.

— A composição, a melodia e a letra foram feitas por mim, mas a alma pertence a José Claudio Machado. Quando vejo um piá cantá-la com emoção, sinto que fiz uma obra importante. É a recompensa que um compositor tem com seu trabalho. O cunho popular deu esse conceito a ela — comenta Moraes.

O efeito que a melodia da milonga causa nas pessoas é o trunfo do compositor, que prefere escrever suas músicas somente depois de deixar prontos os acordes, em um movimento inverso ao tradicional.
— A minha mãe nunca foi de dar palpite sobre qualquer música. De repente eu vejo ela encostada na porta do meu quarto, enquanto eu estava compondo, e me diz que esta seria uma canção muito bonita. Ou seja, uma pessoa que não é acostumada com essa cultura se identificou com ela. A melodia que a levou a dizer isso — explica.

Além da chuvarada "se metendo a besta" que castiga o trabalho do tropeiro e da saudade da "amada" que ficou cuidando do rancho, Moraes utilizou figuras reais para rechear o significado da música. Uma delas é o cavalo baio de José Claudio Machado, o Bandolim, que até hoje habita o sítio do cantor, em Guaíba. No final, recorda o Festival da Barranca, que ocorre todos os anos em São Borja, durante a Semana Santa.

— O sujeito está na tropa, cansado, mas ainda vai na Barranca participar como músico. Só depois volta para casa — romanceia Moraes.


Por: Roberto Azambuja de Zero Hora

Sem comentários:

Enviar um comentário