CONHEÇA O BUGIO - A QUERÊNCIA DO BUGIO

             Esse livro é um apanhando, histórico e cultural, do que aconteceu para a Criação do Festival Querência do Bugio – de São Francisco de Assis – acontecimento iniciado no ano 1989 e ocorrido posteriormente nos anos de 1992 e 1993.

            A documentação toda encontra-se guardada, na espera da criação e um acervo, que possa contar às novas gerações a história que vem se perdendo ao longo do tempo e para não deixar morrer esse movimento cultural/musical, que tão bem expressa a cultura do Rio Grande do Sul – o Bugio – ritmo criado nas Serranias do Mato Grande, 5º distrito de São Francisco de Assis, na gaitinha do Neneca Gomes e que, hoje, habita bem menos do que merece, alguns palcos e algumas cordionas desse estado tão rico culturalmente.

            A História de um povo e de um movimento, não pode ficar trancada nas mazelas da ignorância cultural, que sonegam às novas gerações o conhecimento e o bem maior, que é a cultura de um povo. Esperamos que, com a leitura desse livro, possam acordar para o tempo e rever os conceitos políticos culturais que permeiam as mentes que não pensam no que já foi feito.

            Que possamos acordar para a vida e para o tempo.

                                                                      Paulo Ricardo Costa  


                         DA CRIATURA À CRIAÇÃO!

             “São Chico de Assis, um chão pesado de história”.

Na minha infância e posteriormente na adolescência, estudando no Colégio Senador Salgado Filho, em São Francisco de Assis, sempre ouvia dizer que: “São Chico é um chão pesado de história”.

            Tive a graça de ter um dos maiores professores de História, senão o maior, o Professor Sebastião Oliveira, que nas suas memoráveis aulas, sempre tinha algum aspecto sobre São Francisco de Assis, seja sobre o tempo, seja sobre fatos históricos ocorridos nesse município: a Revolução de 23; a participação direta desta terra nos combates da praça; O Combate do Capão da Laranjeira, com a morte do Cel. Fabrício Pilar; a participação de assisenses como Coronel Paulino Cipriano Haigert, o Cel. Pimba, que sempre me instigou a conhecer a sua história; a participação de Inácio Côrtes nos voluntários de 1893, outra revolta que marcou o tempo e os campos de São Chico; a inquieta morte de João de Deus e a peregrinação de fiéis em seu túmulo, ao lado do campinho onde jogávamos bola, entre outras façanhas de assisenses que marcaram à ponta de lança e adaga a História deste chão.

             Posteriormente, quando já adulto, pude conhecer a expressão maior da cultura de São Francisco de Assis: o Poeta Salvador Ferrando Lamberty, o qual já admirava por seus poemas, num livro que meu pai havia ganho do autor e que tinha uma poesia, que eu declamava nos meus dias felizes, lá naquele ranchinho pobre, na minha Vista Alegre,  5º distrito desse município. Essa poesia fala de um amor que finda em morte, onde os dois “enamorados” preferem um copo de veneno, do que a separação.

            Quando conheci pessoalmente o mestre Salvador, suas ideias e seu jeito fácil de transmitir o que pensava, fez brotar em meu peito uma ânsia louca de conhecer melhor a História e a cultura tão bem defendida por meu pai, nos encontros de Patrões e Congressos Tradicionalistas, representando o CTG Tropeiro das Missões da velha e saudosa Vila Kraemer.

            O mestre Salvador, nessa época, estava finalizando a pesquisa sobre o reconhecimento do ritmo bugio, e talvez fosse a empolgação de suas palavras que acordou esse sentimento tão belo de deixar alguma coisa para um dia tornar-se História.

            Algum tempo depois, o mestre divulga sua pesquisa no “ABC do Tradicionalismo Gaúcho” e presenteia-me com o livro, autografado. Nesse período eu já fazia parte do movimento cultural, não só no Grêmio Estudantil do Colégio Salgado Filho, posteriormente chamado de Escola São Francisco, bem como, pelos fandangos do CTG Tropeiro das Missões, onde o meu tio Valterom Moreira era Patrão.

             A Tropeada da Cultura Rio-grandense, na sua primeira edição no Clube Assisense e posteriormente nas suas edições no CTG Negrinho do Pastoreio, com a primeira mostra de música, foi o início de uma caminhada rumo ao espaço que tanto sonhara. Depois veio o Festival da Música Crioula de Santiago, que me ajudou a sonhar mais alto, em 1988 com a participação do Grupo Pega de Arranque, e a Salamanca do Jarau, com a participação de “Os Mandurins”.

            No ano de 1989, infelizmente, tive que me distanciar de São Chico. Após fazer parte da Criação do Grupo de Arte e Cultura Ana Terra, que fez uma única apresentação no palco do CTG Negrinho do Pastoreio, onde apresentamos músicas memoráveis, e naquela noite toquei “bombo leguero”, para a invernada de danças ao lado de Nilton Ferreira. No fim desse ano fui morar em Santiago.

             A distância e a saudade dançavam de esporas no meu coração. Essa ausência da minha terra e de velhos parceiros, fui aos poucos substituindo por grandes amigos, como Marco Antônio Nunes, Jonas Diniz, Paulo Cardoso, Seu Severo, entre tantos, mas me refiro a estes, porque foi com eles que fui no ano de 1990, no “Manancial Missioneiro”, festival da Bossoroca, “Grito do Nativismo” de Jaguari, Festival de Mata e ao “Canto dos Sete Povos” em São Luiz Gonzaga.

            Convivendo pelos bastidores dos festivais, conhecendo músicos, poetas, radialistas, cantores, apresentadores, organizadores e a forma como eram organizados, na sua amplitude, idealizei fazer um festival em São Francisco de Assis e esse sonho foi tão grande que fiz o meu primeiro projeto e um desenho. 

       Nesse desenho, brotava em meu peito a ânsia de ver o bugio voltando para a sua querência, à velha casa do Neneca, lá no Mato Grande... Nesses dias fizemos uma entrevista na Rádio Santiago, onde colocamos as possibilidades desse sonho.
            Todas as manhãs ou em quase todas, tive o grande privilégio de matear com um dos mais celebres poetas da velha Santiago, Dr. Valdir Amaral Pinto, que sempre de cuia na mão, me chamava para uns dedos de prosa, contando-me histórias de encharcar os olhos e lustrar o coração. Por diversas vezes me falou de São Chico e dos grandes amigos que havia por lá.
            Dr. Valdir com sua voz pausada e pensativa sempre tecia grandes elogios a arte e a cultura da minha São Chico, fazendo brotar em mim, além da imensa saudade, uma vontade louca de fazer algo por minha gente.
            Depois de três anos morando longe da terra Natal, tive a oportunidade de voltar. E nos peçuelos da memória, trazia rascunhos dos festivais por onde andei e um pouco mais de conhecimentos com os amigos que conquistei.
            Nessa época, havia um grupo chamado “Grupo de Arte e Cultura Candelária do Ibicuí”, o qual o Eri fazia parte. Grupo esse de pesquisas e que já havia feito alguns eventos anteriormente, todo constituído de pessoas conhecidas, que talvez isso pudesse facilitar nosso trabalho.

Foi marcado uma reunião, em uma terça-feira, na casa situada na esquina das ruas Borges de Medeiros e Ernesto Alves, quase em frente ao local em que o Eri trabalhava, no Escritório Charrua, onde eu fui convidado para expor o material que havia recolhido, com a proposta de um festival para São Francisco de Assis. Após muita conversa, desconfiança e imaginação, nascia ali, o segundo passo para a participação das pessoas buscando fomentar a ideia da criação do 1º Querência do Bugio.

O nome Querência do Bugio foi, em primeira mão, contestado por alguns, que queriam o nome de Candelária do Ibicuí, no intuito de divulgar essa que foi uma das primeiras Reduções Jesuíticas e localizada às margens do Rio Ibicuí, em São Francisco de Assis, o qual presenteava ao grupo com seu nome, mas conseguimos convencê-los da importância do ritmo bugio e dos doze anos de pesquisa de Salvador Ferrando Lamberty, para a cidade e para o Rio Grande do Sul. A criação de um festival seria a coroação desse intento maior do mestre poeta.

           Nesse ano, era ano de eleição. A coligação da UPA (União Progressista Assisense – união de PDT e PMDB) fazia suas reuniões no escritório que eu trabalhava, na CIAL. Seu Ciro Almeida era o atual Presidente do PDT. Pois foi numa ocasião dessas, que o candidato a prefeito Paulo Roberto Carvalho, sempre educado e atencioso comigo, ouviu-me atentamente sobre o projeto de fazer um festival e colocou-me que, caso fosse eleito, nós faríamos o evento com o apoio da Prefeitura Municipal, caso que veio confirmar-se com sua eleição dia 15 de novembro de 1992.


             Após a eleição do Prefeito Paulo Carvalho e de algumas reuniões do G.A.C. Candelária do Ibicuí na Câmara Municipal de Vereadores, com o apoio da CIMENSUL de Luiz Carlos Sudati – o Bica – que foi candidato a vereador nessas eleições, e pela amizade, emprestou-me o seu computador, onde fiz esse documento enviando para o comércio local, pedindo apoio para a realização desse grande sonho. Nesse mesmo escritório, posteriormente, fiz todo o material de divulgação do Festival Querência do Bugio.

           






          
 Nossos encontros eram semanais na Câmara Municipal de Vereadores, sempre levando nomes e novas pessoas, pois éramos em poucos para tamanha responsabilidade e cargos. O GAC Candelária do Ibicuí era formado basicamente por: Valdevi Maciel, Eri Côrtes, José Valter Dornelles, Zeli Siqueira, Clênio Medeiros, Idarci Frescura e Valdenir Guareschi – eu nunca fiz parte do grupo.

            Com a falta de pessoas para trabalhar na realização do evento, convidei o Rogério Ayres, que na época era Correspondente do Jornal A Razão e o Dr. Gaspar Paines. Outros convidaram: João Carlos da Luz e Gládis, sua esposa; Marivone Guareschi esposa do Valdenir; Jurema Maciel, esposa do Valdevi, e o senhor Júlio Rech. Assim teríamos as pessoas responsáveis que formariam comissões que auxiliariam antes e durante o festival.

           Foi então criado pelo Francisco Ênio Cunha , de apelido Kiko, o primeiro desenho do festival e as primeiras matérias divulgadas pelos jornais da região, conforme as matérias abaixo: 





            Aos poucos, mais pessoas foram se somando e ajudando, como é o caso dos Grupos: “Piazitos do Fandango”, nas pessoas do Jader Berguemaier e Wilmo Comis; “Ases do Fandango”, na pessoa do Caio Lançanova. Tivemos auxílio dos senhores: Valteron Moreira, que nos emprestou por diversas vezes sua belina, para divulgar o evento; Ciro Vieira de Almeida, que nos emprestou o carro e o escritório para ser o ponto central de todo o movimento; e minhas falas, divulgando o festival pelas cidades vizinhas.

           Lembro-me de uma viagem de ônibus a Alegrete e Uruguaiana, levando o regulamento nas rádios e convidando músicos, com o dinheiro contado, dormindo num banco da rodoviária de Uruguaiana e acordado pelos brigadianos, que não queriam me deixar repousar naquele local. No outro dia fui para Itaqui, na Rádio Cruzeiro do Sul, contei a história do dia anterior e me deram um café com bolachão e mortadela. Posteriormente, fui a São Borja e enfim, em casa novamente, pagando tudo do meu bolso e das ajudas que seu Ciro Almeida me dava.

 Em pouco mais de três meses após a primeira reunião, a Capital Mundial do Bugio começava a entrar para a história dos festivais do Rio Grande do Sul, dessa forma, muitos músicos, poetas, compositores, arranjadores além do povo assisense, começavam a sair do anonimato cultural e entravam de vez para os anais da História. Isso foi possível, através do primeiro rascunho de um regulamento que elaborei na solidão das noites santiaguenses e que veio ser luz para o maior evento cultural da minha terra.                   

Com os “Piazitos do Fandango”, em uma viagem a Santa Rosa, para uma Mateada da RBS TV e a propaganda da Ervateira Rei Verde, conhecemos Darlene Hilbig, cantora, patrocinada pela Ervateira referida. Essa empresa nos presenteou com uma mateada em São Chico, com show da Darlene, os “Piazitos do Fandango” e artistas da terra, na praça Coronel Manoel Viana. Oportunidade em que houve o lançamento do festival “Querência do Bugio”, salvo engano no dia 04 de janeiro, feriado em São Chico.

             Em Santa Maria, vim por algumas vezes e fui muito bem recebido nos programas do apresentador José Luiz. Numa certa ocasião, vim com o Valdevi Maciel e estivemos na rádio Guaratã AM, numa galeria no calçadão e na Rádio Imembui AM. Conseguimos que ele divulgasse o festival no programa “Isto é Rio Grande”, da RBS TV, que na época era um sucesso e passava nas manhãs de domingo nesta emissora.           

Também realizávamos reuniões diárias na Câmara Municipal de Vereadores, onde criamos, a partir do rascunho abaixo, o qual foi elaborado em noites longas, onde sonhei com o que poderia ser, e que se tornou o regulamento do “Festival Querência Do Bugio”. 
                     








        
        Nossa preocupação era tanta, que pensávamos até nos valores que poderíamos arrecadar, para amenizar os gastos que teríamos. A cima, estão alguns valores calculados para a época, valores enxugados já que nosso trabalho e viagens foram com verbas colocadas do nosso bolso, dinheiro que não me fez falta, pois à cultura adquirida não há dinheiro que pague.           

 No final da primeira quinzena de janeiro aconteceu a “Gauderiada da Canção” de Rosário do Sul e foi para lá que nós fomos numa tarde/noite chuvosa, bem na época em que estavam construindo o asfalto entre Cacequi e Rosário do Sul. Em um opala bege, emprestado pelo Fernandinho Cardoso e com um pneu de estepe emprestado pelo missionário Wladimir Bianchi, saímos rumo a Rosário do Sul, conforme relatório da viagem feito na época:



Com as comissões todas escolhidas e comprometidas com o evento, tudo estava pronto, só na espera do início do grande evento, que aconteceu pela manhã daquele feliz dia de 12 de fevereiro de 1993.

            A abertura, pela parte da manhã, com os integrantes do Moto Clube Assisense, que recepcionavam cada músico que chegava na cidade o conduzindo ao ginásio de esportes através de uma motosseata. No local, cavalarianos do CTG Negrinho do Pastoreio, Pedro Telles Tourem e Fazenda Branca os recepcionavam, mostrando a cultura e o amor à arte de um povo aguerrido e guapo.

            Peões, prendas, patrões, amigos, visitantes, poetas, músicos, compositores, todos se misturavam, numa irmandade tão vista em festivais por onde andei e que sonhava um dia ter na minha terra. E teve!

À noite, o ginásio municipal de esportes aos poucos foi recebendo o que de melhor havia na música e na arte musical do Rio Grande do Sul: músicos, poetas e compositores, unidos ao povo, entoavam as mais belas melodias, acariciadas pelo sorriso largo e fraterno dos assisenses.

            Tudo foi magnífico! A recepção dos convidados, o credenciamento, a portaria, a copa, a cozinha, os diretores de palco e jurados. Todos comprometidos, faziam valer as histórias que o Dr. Valdir me contava, de um povo hospitaleiro e um chão pesado de história como São Francisco de Assis.

            Nesses dias mais pessoas se juntaram às comissões, para ajudar a escrever essa bela página de nossa história.

 Lembro do Beto Côrtes, a Beatriz, o Cleber, meu irmão, o Gorjeta e sua equipe de portaria, o Fernando Cardoso, José Pedro Belagamba e certamente muito outros que esquecerei de mencionar, mas foram de suma importância para a realização do evento.

 Após ao término do festival, nas altas horas da madrugada, o pessoal da limpeza, orquestrado pelo maestro Perci da Rosa, secretário de obras do município, faziam seu show, deixando tudo limpinho e arrumado para o dia seguinte. Ao meio dia a comida servida pelos associados do CTG Negrinho Pastoreio não deixava ninguém se lembrar das casas.

            O painel de fundo de palco foi pintado pelo Francisco Ênio Cunha, o Kiko. A sonorização teve como shows: Wilson Pain, Telmo de Lima Freitas, Adair de Freitas, Sabani Felipe de Souza, Darlene Hilbig, Piazitos do Fandango e gente da terra, que não deixaram um só momento de emocionar a todos que ali estavam.

            Nas três noites, mais de duas mil pessoas passaram pelo ginásio municipal de esportes Franklin Bastos de Carvalho e entre elas, muitas com credenciamento para livre entrada e saída, além dos melhores lugares para assistir o evento, abaixo, cito seus nomes:


                A comissão avaliadora composta por: Zézinho Fourquim, Salvador Lamberty, João Damásio Catelan, Sérgio Oliveira e Sabani Felipe de Souza, pensaram na grandeza do festival e deixaram para os anais da história um dos mais belos discos da arte musical Rio grandense.
                   Das mais de duas centenas de músicas inscritas para o festival, 24 foram ao palco. São elas:

Para facilitar a apresentação de todas as composições que foram ao palco, os apresentadores receberam os seguintes documentos:

Foram classificadas para o disco as seguintes músicas, nessa mesma ordem:

Após o término do festival, muitas matérias foram divulgadas na imprensa, apresentando o resultado desse evento que marcou a cidade e as pessoas de São Francisco de Assis:


PREMIAÇÃO:








































 
                 O Festival “Querência do Bugio”, é hoje, uma realidade que orgulha, não só São Francisco de Assis, mas, certamente, a Pátria Grande do Sul, pois a criação cultural tão bem executada pelos dedos ágeis de Neneca Gomes, somado à preocupação de Salvador Lamberty em estudar e documentar o ritmo gaúcho, oriundo dessa terra, só poderia resultar nesse grande evento que traz no nome uma identidade pertencente a São Francisco de Assis.

           Fica aqui o meu registro, para que o tempo jamais possa esquecer de olhar por aqueles que deram, suor e sangue para que esse evento fosse realizado. Não me refiro somente à minha pessoa, pois sei do que fiz e o trabalho de convencer a outros tantos o quanto éramos capazes, mas também de pessoas como: Eri Côrtes, Gaspar Paines, Idarci Frescura, Francisco Ênio Cunha - Kiko -  José Walter Dornelles, Zeli Érbice, Valdevi Maciel, Rogério Ayres, José Pedro Bellegamba, Perci da Rosa, João Carlos Guedes da Luz, Gladis da Luz, Idarci Frescura, Valdemar Guareschi, Marivone Guareschi, Beatriz, Cleber Rogério, Gorjeta,  além dos grupos: Piazitos do Fandango e Ases do Fandango, também , às entidades parceiras: CTG Pedro Telles Tourem, CTG Negrinho do Pastoreio. O apoio da Rádio Difusão Assisense,  do prefeito Paulo Roberto Carvalho, do presidente da Câmara Municipal de Vereadores Vasco Carvalho, do Comandante da Brigada Militar se não me engano era Moura Fão, da Delegacia de Polícia, Rotary Clube Assisense, Moto Clube Assisense, Grupo de Escoteiros Ytajuru, Escritório Charrua na pessoa de Valterom Moreira, CIAL Negócios Imobiliários na pessoa do Sr. Ciro Vieira de Almeida, das Prendas dos CTGs e Piquetes, entre tantos outros anônimos que trabalharam incansavelmente tais como: Fernandinho Cardoso, Paulinho Côrrea, José Roberto Côrtes – o Beto.

             Assim, mais uma página foi escrita, talvez o tempo e a falta de memória dos que tentam fazer a história de São Francisco de Assis, não deram a oportunidade de os mais novos, conhecer o que tantos fizeram e ainda fazem pela cultura dessa terra. Que a vida não venha, mais tarde, cobrar dos esquecidos, e quem sabe um dia possam tirar a venda de sua cegueira e assim possam ver a luz da cultura, que até se esconde, mas jamais se apaga.

             Depois de anos guardando esse material, sem nunca ser ouvido ou procurado, hoje, presenteio ao grande mestre Salvador Lamberty, para expor em seu Recanto Cultural, para que outras pessoas que interessem, possam querer guardar uma memória desse evento e acima de tudo possam saber que nada acontece por acaso e nem nasce de susto, como muitos vinham falando, por não querer falar somente a verdade, verdade que a vida guarda para que um dia possa nascer num sonho lindo.

           Mas a história do bugio, ritmo, não ficou somente nesses três dias de festival, com a imensa repercussão através das rádios que transmitiram o festival, a divulgação nos jornais e até mesmo nas televisões, nesse mesmo ano de 1993, no dia do folclore, 22 de agosto,  fizemos no CTG Negrinho do Pastoreio um debate com Salvador Ferrando Lamberty e Telmo de Lima Freitas, onde, tivemos uma “ponchada” de causos e versos, tendo como tema principal a criação do ritmo  bugio. Nesse debate, Telmo de Lima Freitas, expôs ter conhecimento e propriedade para falar sobre esse ritmo já estudado e comentado por Salvador Ferrando Lamberty, em seu livro “ABC do Tradicionalismo”.

        Telmo de Lima Freitas um cantor de renome, poeta, pesquisador, músico e historiador conceituado, com raízes no 4º distrito de São Francisco de Assis, Pinheiro Bonito, tendo como tronco a família “Pires de Lima”, uma família de gaiteiros e conhecedores do ritmo bugio, como é o caso de seu tio Cantalício Pires de Lima,             que também tocava a música “Os Três Bugios” e era contemporâneo do gaiteiro Neneca Gomes.

Salvador Lamberty abriu o debate falando: “Da importância desse Patrimônio musical, o único ritmo musical gaúcho - o Bugio – onde muitos pesquisadores defendiam que não deveria ser mexido, devido ser uma página folclórica que pertence ao folclore do Rio Grande do Sul, mas porque não nos aprofundarmos, conhecermos e adotarmos um filho que era nosso e que deveria ser estudado?”.

 Entre tantos assuntos levantados, pesquisados e estudados há mais de doze anos, o poeta e escritor, acima mencionado, falou sobre a importância do entendimento de como precedeu e como chegou a importante conclusão desse trabalho, dando passo a passo, à grandeza de tornar o ritmo bugio, matéria principal da cultura desse estado.

 No final do encontro, Telmo de Lima Freitas, explanou a criação do ritmo bugio através de uma linha do tempo em consonância com outros ritmos musicais oriundos de fora. Após isso, para o delírio do público assistente, foi executado, numa gaitinha de 48 baixos OS TRÊS BUGIOS, na interpretação de Eurides Nunes, músico conceituado e exímio tocador de gaita de botão, que mostrou a todos a criação de Neneca Gomes e que hoje, trinta anos após esse acontecido, colocamos na pauta, através do conhecimento do professor e doutor em música, membro da Orquestra Sinfônica de Santa Maria, Miguel Ângelo Zanotelli, que gentilmente nos cedeu seu trabalho em prol da cultura, colocando na partitura, o qual agradecemos. 

            Passados mais de trinta anos desse feito, hoje, podemos dizer que o Festival Querência do Bugio está consagrado em todo o estado do Rio Grande do Sul e quem sabe, fora dele. As quase trezentas músicas que estiveram em palco, com mais de duzentas gravadas para a posteridade, sendo a metade delas de bugios, nessas quinze edições do festival, só mostram o quanto estamos certos, em dar prosseguimento à pesquisa, que começou solitária com Salvador Ferrando Lamberty, em 1972, quando todos, nem sonhavam, que nas matarias do Mato Grande, habitava uma preciosidade cultural que São Francisco de Assis legou ao mundo através da cordeona de Neneca Gomes.

           O Festival Querência do Bugio, possui mais de cinco mil músicas nas triagens, mais de sessenta shows em palco, mais de uma centena de profissionais de rádios, jornais, televisão e web, e outros tantos que trabalharam para levar a musicalidade feita nesta terra para os quatro cantos desse Rio Grande e fora dele.

            Além de aprendizados, o “Querência do Bugio” nos trouxe espaço para a cultura, fomentada através das canções que passaram por São Francisco de Assis, dona de um povo hospitaleiro, que com muito carinho e dedicação tornou esse espaço cultural um momento onde os familiares, puderam, durante os três dias do festival, se encontrar ou reencontrar, levando assim, a despertar sonhos de muitos que, aproveitaram os apartes caseiros, para mostrar um pouco do seu caminho na arte.

           Que o ritmo bugio é de São Francisco de Assis, todos sabem, que nasceu da gaitinha do Neneca Gomes, também sabem, agora só falta o Rio Grande do Sul reconhecer o que os doze anos de pesquisas de Salvador Lamberty trouxe à luz do mundo, com a edição e dois livros: “O ABC do Tradicionalismo Gaúcho” e “O Bugio”, que deixam explanado, passo a passo, o nascimento desse ritmo e que posteriormente foi chancelado no Festival “Querência do Bugio”, que desde a sua criação, na labuta e persistência de um grupo de sonhadores,  nos calorosos dias 12, 13 e 14 de fevereiro de 1993, mostra ao mundo essa página tão importante da cultura de um estado tão rico e de um município como São Francisco de Assis, tão pesado de história, de cultura e de um povo que ama essa terra, pois sempre, indiferente do tempo, os de agora e os que passaram, defendem e tem a certeza de que “Este bugio tem querência”.

                                                     Santa Maria, 12 de Dezembro de 2010




                                                                      Paulo Ricardo Costa
                                                                Criador da Querência do Bugio