Esse livro é um apanhando, histórico e cultural, do que aconteceu para a Criação do Festival Querência do Bugio – de São Francisco de Assis – acontecimento iniciado no ano 1989 e ocorrido posteriormente nos anos de 1992 e 1993.
A documentação toda encontra-se guardada, na espera da
criação e um acervo, que possa contar às novas gerações a história que vem se
perdendo ao longo do tempo e para não deixar morrer esse movimento
cultural/musical, que tão bem expressa a cultura do Rio Grande do Sul – o Bugio
– ritmo criado nas Serranias do Mato Grande, 5º distrito de São Francisco de
Assis, na gaitinha do Neneca Gomes e que, hoje, habita bem menos do que merece,
alguns palcos e algumas cordionas desse estado tão rico culturalmente.
A História de um povo e de um movimento, não pode ficar
trancada nas mazelas da ignorância cultural, que sonegam às novas gerações o
conhecimento e o bem maior, que é a cultura de um povo. Esperamos que, com a
leitura desse livro, possam acordar para o tempo e rever os conceitos políticos
culturais que permeiam as mentes que não pensam no que já foi feito.
Que possamos acordar para a vida e para o tempo.
Paulo Ricardo Costa
DA CRIATURA À CRIAÇÃO!
“São Chico de Assis, um chão pesado de história”.
Na
minha infância e posteriormente na adolescência, estudando no Colégio Senador Salgado
Filho, em São Francisco de Assis, sempre ouvia dizer que: “São Chico é um chão
pesado de história”.
Tive a graça de ter um dos maiores professores de História,
senão o maior, o Professor Sebastião Oliveira, que nas suas memoráveis aulas,
sempre tinha algum aspecto sobre São Francisco de Assis, seja sobre o tempo, seja
sobre fatos históricos ocorridos nesse município: a Revolução de 23; a
participação direta desta terra nos combates da praça; O Combate do Capão da
Laranjeira, com a morte do Cel. Fabrício Pilar; a participação de assisenses
como Coronel Paulino Cipriano Haigert, o Cel. Pimba, que sempre me instigou a
conhecer a sua história; a participação de Inácio Côrtes nos voluntários de
1893, outra revolta que marcou o tempo e os campos de São Chico; a inquieta
morte de João de Deus e a peregrinação de fiéis em seu túmulo, ao lado do
campinho onde jogávamos bola, entre outras façanhas de assisenses que marcaram à
ponta de lança e adaga a História deste chão.
Posteriormente, quando já adulto, pude conhecer a expressão maior da cultura de São Francisco de Assis: o Poeta Salvador Ferrando Lamberty, o qual já admirava por seus poemas, num livro que meu pai havia ganho do autor e que tinha uma poesia, que eu declamava nos meus dias felizes, lá naquele ranchinho pobre, na minha Vista Alegre, 5º distrito desse município. Essa poesia fala de um amor que finda em morte, onde os dois “enamorados” preferem um copo de veneno, do que a separação.
Quando conheci pessoalmente o mestre Salvador, suas ideias
e seu jeito fácil de transmitir o que pensava, fez brotar em meu peito uma
ânsia louca de conhecer melhor a História e a cultura tão bem defendida por meu
pai, nos encontros de Patrões e Congressos Tradicionalistas, representando o
CTG Tropeiro das Missões da velha e saudosa Vila Kraemer.
O mestre Salvador, nessa época, estava finalizando a pesquisa
sobre o reconhecimento do ritmo bugio, e talvez fosse a empolgação de suas
palavras que acordou esse sentimento tão belo de deixar alguma coisa para um
dia tornar-se História.
Algum tempo depois, o mestre divulga sua pesquisa no “ABC
do Tradicionalismo Gaúcho” e presenteia-me com o livro, autografado. Nesse
período eu já fazia parte do movimento cultural, não só no Grêmio Estudantil do
Colégio Salgado Filho, posteriormente chamado de Escola São Francisco, bem
como, pelos fandangos do CTG Tropeiro das Missões, onde o meu tio Valterom
Moreira era Patrão.
A Tropeada da Cultura Rio-grandense, na sua primeira edição no Clube Assisense e posteriormente nas suas edições no CTG Negrinho do Pastoreio, com a primeira mostra de música, foi o início de uma caminhada rumo ao espaço que tanto sonhara. Depois veio o Festival da Música Crioula de Santiago, que me ajudou a sonhar mais alto, em 1988 com a participação do Grupo Pega de Arranque, e a Salamanca do Jarau, com a participação de “Os Mandurins”.
No ano de 1989, infelizmente, tive que me distanciar de
São Chico. Após fazer parte da Criação do Grupo de Arte e Cultura Ana Terra,
que fez uma única apresentação no palco do CTG Negrinho do Pastoreio, onde
apresentamos músicas memoráveis, e naquela noite toquei “bombo leguero”, para a
invernada de danças ao lado de Nilton Ferreira. No fim desse ano fui morar em
Santiago.
A distância e a saudade dançavam de esporas no meu coração. Essa ausência da minha terra e de velhos parceiros, fui aos poucos substituindo por grandes amigos, como Marco Antônio Nunes, Jonas Diniz, Paulo Cardoso, Seu Severo, entre tantos, mas me refiro a estes, porque foi com eles que fui no ano de 1990, no “Manancial Missioneiro”, festival da Bossoroca, “Grito do Nativismo” de Jaguari, Festival de Mata e ao “Canto dos Sete Povos” em São Luiz Gonzaga.
Convivendo pelos bastidores dos festivais, conhecendo
músicos, poetas, radialistas, cantores, apresentadores, organizadores e a forma
como eram organizados, na sua amplitude, idealizei fazer um festival em São
Francisco de Assis e esse sonho foi tão grande que fiz o meu primeiro projeto e
um desenho.
Foi
marcado uma reunião, em uma terça-feira, na casa situada na esquina das ruas
Borges de Medeiros e Ernesto Alves, quase em frente ao local em que o Eri
trabalhava, no Escritório Charrua, onde eu fui convidado para expor o material
que havia recolhido, com a proposta de um festival para São Francisco de Assis.
Após muita conversa, desconfiança e imaginação, nascia ali, o segundo passo
para a participação das pessoas buscando fomentar a ideia da criação do 1º
Querência do Bugio.
O nome
Querência do Bugio foi, em primeira mão, contestado por alguns, que queriam o
nome de Candelária do Ibicuí, no intuito de divulgar essa que foi uma das
primeiras Reduções Jesuíticas e localizada às margens do Rio Ibicuí, em São
Francisco de Assis, o qual presenteava ao grupo com seu nome, mas conseguimos
convencê-los da importância do ritmo bugio e dos doze anos de pesquisa de
Salvador Ferrando Lamberty, para a cidade e para o Rio Grande do Sul. A criação
de um festival seria a coroação desse intento maior do mestre poeta.
Nesse ano, era ano de eleição. A coligação da UPA (União Progressista Assisense – união de PDT e PMDB) fazia suas reuniões no escritório que eu trabalhava, na CIAL. Seu Ciro Almeida era o atual Presidente do PDT. Pois foi numa ocasião dessas, que o candidato a prefeito Paulo Roberto Carvalho, sempre educado e atencioso comigo, ouviu-me atentamente sobre o projeto de fazer um festival e colocou-me que, caso fosse eleito, nós faríamos o evento com o apoio da Prefeitura Municipal, caso que veio confirmar-se com sua eleição dia 15 de novembro de 1992.
Com a falta de pessoas para trabalhar na realização do
evento, convidei o Rogério Ayres, que na época era Correspondente do Jornal A Razão
e o Dr. Gaspar Paines. Outros convidaram: João Carlos da Luz e Gládis, sua
esposa; Marivone Guareschi esposa do Valdenir; Jurema Maciel, esposa do
Valdevi, e o senhor Júlio Rech. Assim teríamos as pessoas responsáveis que
formariam comissões que auxiliariam antes e durante o festival.
Foi então criado pelo Francisco Ênio Cunha , de apelido Kiko, o primeiro desenho do festival e as primeiras matérias divulgadas pelos jornais da região, conforme as matérias abaixo:
Lembro-me de uma viagem de ônibus a Alegrete e Uruguaiana, levando o regulamento nas rádios e convidando músicos, com o dinheiro contado, dormindo num banco da rodoviária de Uruguaiana e acordado pelos brigadianos, que não queriam me deixar repousar naquele local. No outro dia fui para Itaqui, na Rádio Cruzeiro do Sul, contei a história do dia anterior e me deram um café com bolachão e mortadela. Posteriormente, fui a São Borja e enfim, em casa novamente, pagando tudo do meu bolso e das ajudas que seu Ciro Almeida me dava.
Em pouco mais de três meses após a primeira reunião, a Capital Mundial do Bugio começava a entrar para a história dos festivais do Rio Grande do Sul, dessa forma, muitos músicos, poetas, compositores, arranjadores além do povo assisense, começavam a sair do anonimato cultural e entravam de vez para os anais da História. Isso foi possível, através do primeiro rascunho de um regulamento que elaborei na solidão das noites santiaguenses e que veio ser luz para o maior evento cultural da minha terra.
Com os
“Piazitos do Fandango”, em uma viagem a Santa Rosa, para uma Mateada da RBS TV
e a propaganda da Ervateira Rei Verde, conhecemos Darlene Hilbig, cantora,
patrocinada pela Ervateira referida. Essa empresa nos presenteou com uma mateada
em São Chico, com show da Darlene, os “Piazitos do Fandango” e artistas da
terra, na praça Coronel Manoel Viana. Oportunidade em que houve o lançamento do
festival “Querência do Bugio”, salvo engano no dia 04 de janeiro, feriado em
São Chico.
Em Santa Maria, vim por algumas vezes e fui muito bem recebido nos programas do apresentador José Luiz. Numa certa ocasião, vim com o Valdevi Maciel e estivemos na rádio Guaratã AM, numa galeria no calçadão e na Rádio Imembui AM. Conseguimos que ele divulgasse o festival no programa “Isto é Rio Grande”, da RBS TV, que na época era um sucesso e passava nas manhãs de domingo nesta emissora.
Também realizávamos reuniões diárias na Câmara Municipal de Vereadores, onde criamos, a partir do rascunho abaixo, o qual foi elaborado em noites longas, onde sonhei com o que poderia ser, e que se tornou o regulamento do “Festival Querência Do Bugio”.No final da primeira quinzena de janeiro aconteceu a “Gauderiada da Canção” de Rosário do Sul e foi para lá que nós fomos numa tarde/noite chuvosa, bem na época em que estavam construindo o asfalto entre Cacequi e Rosário do Sul. Em um opala bege, emprestado pelo Fernandinho Cardoso e com um pneu de estepe emprestado pelo missionário Wladimir Bianchi, saímos rumo a Rosário do Sul, conforme relatório da viagem feito na época:
Com as comissões todas
escolhidas e comprometidas com o evento, tudo estava pronto, só na espera do
início do grande evento, que aconteceu pela manhã daquele feliz dia de 12 de fevereiro
de 1993.
A abertura, pela parte da manhã, com os integrantes do
Moto Clube Assisense, que recepcionavam cada músico que chegava na cidade o
conduzindo ao ginásio de esportes através de uma motosseata. No local, cavalarianos
do CTG Negrinho do Pastoreio, Pedro Telles Tourem e Fazenda Branca os
recepcionavam, mostrando a cultura e o amor à arte de um povo aguerrido e
guapo.
Peões, prendas, patrões, amigos, visitantes, poetas,
músicos, compositores, todos se misturavam, numa irmandade tão vista em
festivais por onde andei e que sonhava um dia ter na minha terra. E teve!
À
noite, o ginásio municipal de esportes aos poucos foi recebendo o que de melhor
havia na música e na arte musical do Rio Grande do Sul: músicos, poetas e compositores,
unidos ao povo, entoavam as mais belas melodias, acariciadas pelo sorriso largo
e fraterno dos assisenses.
Tudo foi magnífico! A recepção dos convidados, o
credenciamento, a portaria, a copa, a cozinha, os diretores de palco e jurados.
Todos comprometidos, faziam valer as histórias que o Dr. Valdir me contava, de
um povo hospitaleiro e um chão pesado de história como São Francisco de Assis.
Nesses dias mais pessoas se juntaram às comissões, para
ajudar a escrever essa bela página de nossa história.
Lembro do Beto Côrtes, a Beatriz, o Cleber,
meu irmão, o Gorjeta e sua equipe de portaria, o Fernando Cardoso, José Pedro
Belagamba e certamente muito outros que esquecerei de mencionar, mas foram de
suma importância para a realização do evento.
Após ao término do festival, nas altas horas da madrugada, o pessoal da limpeza, orquestrado pelo maestro Perci da Rosa, secretário de obras do município, faziam seu show, deixando tudo limpinho e arrumado para o dia seguinte. Ao meio dia a comida servida pelos associados do CTG Negrinho Pastoreio não deixava ninguém se lembrar das casas.
O painel de fundo de palco foi pintado pelo Francisco
Ênio Cunha, o Kiko. A sonorização teve como shows: Wilson Pain, Telmo de Lima
Freitas, Adair de Freitas, Sabani Felipe de Souza, Darlene Hilbig, Piazitos do
Fandango e gente da terra, que não deixaram um só momento de emocionar a todos
que ali estavam.
Nas três noites, mais de duas mil pessoas passaram pelo ginásio
municipal de esportes Franklin Bastos de Carvalho e entre elas, muitas com
credenciamento para livre entrada e saída, além dos melhores lugares para
assistir o evento, abaixo, cito seus nomes:
Para
facilitar a apresentação de todas as composições que foram ao palco, os apresentadores
receberam os seguintes documentos:
Foram
classificadas para o disco as seguintes músicas, nessa mesma ordem:
O
O Festival “Querência do Bugio”, é hoje, uma realidade que orgulha, não só São Francisco de Assis, mas, certamente, a Pátria Grande do Sul, pois a criação cultural tão bem executada pelos dedos ágeis de Neneca Gomes, somado à preocupação de Salvador Lamberty em estudar e documentar o ritmo gaúcho, oriundo dessa terra, só poderia resultar nesse grande evento que traz no nome uma identidade pertencente a São Francisco de Assis.
Fica aqui o meu registro, para que o tempo jamais possa esquecer de olhar por aqueles que deram, suor e sangue para que esse evento fosse realizado. Não me refiro somente à minha pessoa, pois sei do que fiz e o trabalho de convencer a outros tantos o quanto éramos capazes, mas também de pessoas como: Eri Côrtes, Gaspar Paines, Idarci Frescura, Francisco Ênio Cunha - Kiko - José Walter Dornelles, Zeli Érbice, Valdevi Maciel, Rogério Ayres, José Pedro Bellegamba, Perci da Rosa, João Carlos Guedes da Luz, Gladis da Luz, Idarci Frescura, Valdemar Guareschi, Marivone Guareschi, Beatriz, Cleber Rogério, Gorjeta, além dos grupos: Piazitos do Fandango e Ases do Fandango, também , às entidades parceiras: CTG Pedro Telles Tourem, CTG Negrinho do Pastoreio. O apoio da Rádio Difusão Assisense, do prefeito Paulo Roberto Carvalho, do presidente da Câmara Municipal de Vereadores Vasco Carvalho, do Comandante da Brigada Militar se não me engano era Moura Fão, da Delegacia de Polícia, Rotary Clube Assisense, Moto Clube Assisense, Grupo de Escoteiros Ytajuru, Escritório Charrua na pessoa de Valterom Moreira, CIAL Negócios Imobiliários na pessoa do Sr. Ciro Vieira de Almeida, das Prendas dos CTGs e Piquetes, entre tantos outros anônimos que trabalharam incansavelmente tais como: Fernandinho Cardoso, Paulinho Côrrea, José Roberto Côrtes – o Beto.
Assim, mais uma página foi escrita, talvez o tempo e a falta de memória dos que tentam fazer a história de São Francisco de Assis, não deram a oportunidade de os mais novos, conhecer o que tantos fizeram e ainda fazem pela cultura dessa terra. Que a vida não venha, mais tarde, cobrar dos esquecidos, e quem sabe um dia possam tirar a venda de sua cegueira e assim possam ver a luz da cultura, que até se esconde, mas jamais se apaga.
Depois de anos guardando esse material, sem nunca ser ouvido ou procurado, hoje, presenteio ao grande mestre Salvador Lamberty, para expor em seu Recanto Cultural, para que outras pessoas que interessem, possam querer guardar uma memória desse evento e acima de tudo possam saber que nada acontece por acaso e nem nasce de susto, como muitos vinham falando, por não querer falar somente a verdade, verdade que a vida guarda para que um dia possa nascer num sonho lindo.
Mas a história do bugio, ritmo, não ficou somente nesses três dias de festival, com a imensa repercussão através das rádios que transmitiram o festival, a divulgação nos jornais e até mesmo nas televisões, nesse mesmo ano de 1993, no dia do folclore, 22 de agosto, fizemos no CTG Negrinho do Pastoreio um debate com Salvador Ferrando Lamberty e Telmo de Lima Freitas, onde, tivemos uma “ponchada” de causos e versos, tendo como tema principal a criação do ritmo bugio. Nesse debate, Telmo de Lima Freitas, expôs ter conhecimento e propriedade para falar sobre esse ritmo já estudado e comentado por Salvador Ferrando Lamberty, em seu livro “ABC do Tradicionalismo”.
Telmo de Lima Freitas um cantor de renome, poeta, pesquisador, músico e historiador conceituado, com raízes no 4º distrito de São Francisco de Assis, Pinheiro Bonito, tendo como tronco a família “Pires de Lima”, uma família de gaiteiros e conhecedores do ritmo bugio, como é o caso de seu tio Cantalício Pires de Lima, que também tocava a música “Os Três Bugios” e era contemporâneo do gaiteiro Neneca Gomes.
Salvador Lamberty abriu o debate falando: “Da importância desse Patrimônio musical, o único ritmo musical gaúcho - o Bugio – onde muitos pesquisadores defendiam que não deveria ser mexido, devido ser uma página folclórica que pertence ao folclore do Rio Grande do Sul, mas porque não nos aprofundarmos, conhecermos e adotarmos um filho que era nosso e que deveria ser estudado?”.
Entre tantos assuntos levantados, pesquisados e estudados há mais de doze anos, o poeta e escritor, acima mencionado, falou sobre a importância do entendimento de como precedeu e como chegou a importante conclusão desse trabalho, dando passo a passo, à grandeza de tornar o ritmo bugio, matéria principal da cultura desse estado.
No final do encontro, Telmo de Lima Freitas, explanou a criação do ritmo bugio através de uma linha do tempo em consonância com outros ritmos musicais oriundos de fora. Após isso, para o delírio do público assistente, foi executado, numa gaitinha de 48 baixos OS TRÊS BUGIOS, na interpretação de Eurides Nunes, músico conceituado e exímio tocador de gaita de botão, que mostrou a todos a criação de Neneca Gomes e que hoje, trinta anos após esse acontecido, colocamos na pauta, através do conhecimento do professor e doutor em música, membro da Orquestra Sinfônica de Santa Maria, Miguel Ângelo Zanotelli, que gentilmente nos cedeu seu trabalho em prol da cultura, colocando na partitura, o qual agradecemos.
Passados mais de trinta anos desse feito, hoje, podemos dizer que o Festival Querência do Bugio está consagrado em todo o estado do Rio Grande do Sul e quem sabe, fora dele. As quase trezentas músicas que estiveram em palco, com mais de duzentas gravadas para a posteridade, sendo a metade delas de bugios, nessas quinze edições do festival, só mostram o quanto estamos certos, em dar prosseguimento à pesquisa, que começou solitária com Salvador Ferrando Lamberty, em 1972, quando todos, nem sonhavam, que nas matarias do Mato Grande, habitava uma preciosidade cultural que São Francisco de Assis legou ao mundo através da cordeona de Neneca Gomes.
O Festival Querência do Bugio, possui mais de cinco mil músicas nas triagens, mais de sessenta shows em palco, mais de uma centena de profissionais de rádios, jornais, televisão e web, e outros tantos que trabalharam para levar a musicalidade feita nesta terra para os quatro cantos desse Rio Grande e fora dele.
Além de aprendizados, o “Querência do Bugio” nos trouxe espaço
para a cultura, fomentada através das canções que passaram por São Francisco de
Assis, dona de um povo hospitaleiro, que com muito carinho e dedicação tornou
esse espaço cultural um momento onde os familiares, puderam, durante os três
dias do festival, se encontrar ou reencontrar, levando assim, a despertar
sonhos de muitos que, aproveitaram os apartes caseiros, para mostrar um pouco
do seu caminho na arte.
Que o ritmo bugio é de São Francisco de Assis, todos sabem, que nasceu da gaitinha do Neneca Gomes, também sabem, agora só falta o Rio Grande do Sul reconhecer o que os doze anos de pesquisas de Salvador Lamberty trouxe à luz do mundo, com a edição e dois livros: “O ABC do Tradicionalismo Gaúcho” e “O Bugio”, que deixam explanado, passo a passo, o nascimento desse ritmo e que posteriormente foi chancelado no Festival “Querência do Bugio”, que desde a sua criação, na labuta e persistência de um grupo de sonhadores, nos calorosos dias 12, 13 e 14 de fevereiro de 1993, mostra ao mundo essa página tão importante da cultura de um estado tão rico e de um município como São Francisco de Assis, tão pesado de história, de cultura e de um povo que ama essa terra, pois sempre, indiferente do tempo, os de agora e os que passaram, defendem e tem a certeza de que “Este bugio tem querência”.
Santa Maria, 12 de Dezembro de 2010
Paulo Ricardo Costa
Criador da Querência do Bugio