SÃO FRANCISCO DE ASSIS

História da Cidade 
São Francisco de Assis teve origem nas terras primitivamente habitadas pelos índios tapes, nas quais em 1627 o Padre Roque Gonzales levantou a terceira Redução Jesuíta em solo gaúcho. Essa redução, que recebeu o nome de Candelária do Ibicuí, foi abandonada em 1638, até que, em 1801, na época da conquista das Missões Orientais, é registrada a existência, no mesmo local, da Guarda de São Francisco de Assis. Segundo narrativa lendária, os fundamentos da capela datam de 1819, (para outros é de 1810). A freguesia de São Francisco de Assis surgiu em 1857. Em 1884 foi criado o Município e o povoado elevado a vila. A cidade data de fins de 1938.

Formação Administrativa
O distrito deve sua criação à Lei provincial n.º 358, de 17 de fevereiro de 1857. O Município foi constituído pela Lei provincial n.º 1 427, de 4 de janeiro de 1884, com território desmembrado de Itaqui ou de São Vicente, e instalado a 7 de janeiro de 1885. Em dezembro de 1938 São Francisco de Assis é elevada à categoria de cidade, instalada a 1.º de janeiro seguinte. A comarca só foi em 25 de maio de 1946. 

História
A região passou pelas mãos de donos sucessivos. Era a terra dos tapesguaranisminuanosguenoscarijósarachanescharruascaaguas e guananás.
A ação das bandeiras predadoras devastaram as reduções dos tapes. Após sucessivos combates entre portugueses e espanhóis, e tratados estabelecidos, delimitou-se as fronteiras.
Aqui permaneceram os portugueses, que continuaram a criação de bovinos de corte, atividade que até hoje é predominante no município.
A primeira tentativa de povoamento da região foi feita pelos jesuítas, em 1627, quando o padre Roque Gonzales fundou a redução de Candelária do Ibicuí, que acabou fracassando, e concretizou-se somente no inicio do povoamento em 1809.
Crê-se que a primeira capela foi construída em 1810, tendo como padroeiro São Francisco de Assis.
O município foi palco de dois movimentos revolucionários, em 1893 e 1923. Havia grande número de habitantes contra a permanência do regime imperial, tendo sido muito festejada a Proclamação da República.


Cronologia

§ 1801 - Foi criado o Forte de São Francisco de Assis na sesmaria de Itajuru, à margem esquerda do rio Inhacundá.
§ 1809 - Início do povoamento da sede, em torno do Forte da Capitania do Rio Grande de São Pedro do Sul.
§ 1923 - Revolução de 1923, a "Revolução Libertadora", palco de duros combates entre republicanos e revolucionários. O combate trouxe muitas consequências para a sociedade da época, não só para São Francisco Assis mas para todo o Rio Grande do Sul. Houve uma grande parada econômica devido a falta de mão-de-obra, na época composta quase exclusivamente por homens.

A Revolução de 1923 
A Revolução de 1923 foi o movimento armado ocorrido durante onze meses daquele ano no estado do Rio Grande do Sul, em que lutaram, de um lado, os partidários de Borges de Medeiros (borgistas ou Ximangos, que tinham como distintivo ou característica o lenço na cor branca) e, de outro, os aliados de Joaquim Francisco de Assis Brasil (assisistas ou maragatos que tinham como distinção, distintivo ou característica o lenço na cor vermelha);

Antecedentes 
Republicano e positivista, mas nada simpático à democracia, Júlio Prates de Castilhos, o Patriarca, como era chamado, governou o Rio Grande do Sul com mão de ferro de 1891 até sua morte prematura, em 1903. Para se manter no poder, tomou duas providências: redigiu praticamente sozinho e fez aprovar uma Constituição autoritária e montou uma poderosa máquina política no Partido Republicano Riograndense (PRR), com seus incontáveis chefes locais e seu séquito de agregados, presentes em mais de cem municípios riograndenses. Ao morrer, ficou claro que se fora o ditador, mas a ditadura republicana continuava viva. 

Castilhos foi substituído na presidência do Estado por Borges de Medeiros, que seguiu adotando os mesmos métodos e que também tinha como objetivo perpetuar-se no poder. Em 1922, Borges resolve se candidatar mais uma vez à presidência do Estado e contava, como sempre, com a força do PRR, que não hesitava em apelar para a fraude e a violência, para garantir a reeleição. 
Todavia, dessa feita, há um fato novo: forma-se uma aliança entre vários segmentos da sociedade gaúcha para estimular uma oposição organizada. O veterano político Assis Brasil desafia Borges na disputa nas urnas. 
Divide-se, assim, o Rio Grande, entre assisistas e borgistas, chimangos (numa alusão ao pseudônimo dado a Borges por Ramiro Barcelos, Antônio Chimango) e maragatos (como eram chamados os adeptos do Partido Federalista, identificados pelo uso do lenço vermelho). 
A campanha eleitoral ocorre sob um clima de repressão e violência. Opositores do governo são presos, espancados e até mortos. Locais de reunião dos assisistas são fechados e depredados pela polícia borgista. 
Quando se anuncia o resultado das urnas, com a previsível vitória de Borges de Medeiros, a revolta é geral. A comissão apuradora de votos, formada por pessoas fiéis ao governo, é acusada de fraude eleitoral pela oposição. A disputa nas urnas transforma-se em disputa pelas armas. A oposição, liderada por Assis Brasil, adere à revolta armada para derrubar Borges de Medeiros, que toma posse para um novo mandato em 25 de janeiro de 1923. 
Setores importantes da sociedade gaúcha já andavam descontentes com o governo. A política econômica de Borges precipitara o Estado numa crise financeira que contribuíra para descontentar tanto a elite estancieira como boa parte do movimento operário e estudantil. No plano nacional, Borges se isolara ao fazer oposição à candidatura de Artur Bernardes, a final eleito Presidente da República. 
Em verdade, o ódio entre as facções era mais antigo. Vinha desde a Revolução Federalista de 1893, que teve como marca a degola, dilacerando vidas e trazendo desgraça e tristeza para muitas famílias. Essa Revolução deixou sentimentos de vingança e violência em muitos corações, que teve quase continuidade na Revolução de 1923. 
Operações militares 
Zeca Netto e suas tropas ocupam Pelotas (fonte: Museu Histórico da Biblioteca Pública de Pelotas). 
Os combates iniciaram ao final de janeiro. As cidades de Passo Fundo e Palmeira das Missões foram atacadas pelos caudilhos maragatos vermelhos de Mena Barreto e Leonel da Rocha, que encontraram forte resistência de ambos os lados, não havendo vitória. 
A expectativa de Assis Brasil e seus aliados, ao partir para a luta armada, era a de que o Presidente da República Arthur Bernardes, que não nutria simpatias por Borges, decretasse intervenção federal no Rio Grande do Sul. Mas Borges, um político hábil, se aproximou de Bernardes e frustrou as expectativas de seus opositores. 
Zeca Netto sentado à esquerda. 
Os maragatos, que não estavam devidamente organizados para enfrentar as forças governistas, nem tinham objetivos militares definidos, ficaram confusos ao verem que a pretendida intervenção federal não viria. A continuidade da luta dependia das ações isoladas empreendidas por caudilhos como Honório Lemes e José Antônio Matos Neto, o Zeca Netto. Mas as operações militares ficavam restritas a regiões distantes de Porto Alegre e não conseguiram causar dano a superioridade dos borgistas. Logo os maragatos começaram a se ressentir da falta de homens e de armas. 
Para Assis Brasil e seus aliados mais lúcidos, ficou claro desde logo que não havia possibilidade de vitória militar ( pois os brancos eram mais fortes ), e por isso manifestaram disposição de negociar com o lado contrário. 
Zeca Netto, que se opunha a qualquer acordo com Borges, tentou uma última cartada. Imaginou que se atacasse e tomasse uma cidade importante poderia intimidar os borgistas. Assim, em 29 de outubro, atacou Pelotas, então a maior cidade do interior gaúcho, de surpresa, ao alvorecer, mas a manteve sob seu controle por apenas seis horas, porque as hostes governistas conseguiram se rearticular e receber reforços. Na iminência de ser atacado por forças superiores, o velho caudilho de 72 anos de idade retirou suas tropas. 

Tratado de paz 
A partir deste episódio, os maragatos já não tinham condições de seguir lutando. Por iniciativa do governo federal, realizaram-se negociações comandadas pelo ministro da Guerra, general Fernando Setembrino de Carvalho, com a participação do senador João de Lira Tavares, representante do Congresso. 
Em dezembro de 1923, pacificou-se a revolução no Pacto de Pedras Altas, no famoso castelo, residência de Assis Brasil. Borges pôde permanecer até o final do mandato em 1928, mas a Constituição de 1891 foi reformada. Impediu-se o instituto das reeleições, a indicação de intendentes (prefeitos) e do vice-presidente do Estado. 
O acordo foi importante para o Rio Grande do Sul. O sucessor de Borges no governo gaúcho foi Getúlio Vargas, lenço vermelho. Em 1930, a Frente Única Rio-grandense, sob sua liderança, assume o governo do país, na Revolução de 1930
Segundo o historiador gaúcho Antônio Augusto Fagundes,a Revolução de 1923 “foi a última guerra gaúcha "de feudos, do coronelismo gaúcho", fechando a trindade que se iniciara em 1835 e continuara em 1893”. 

PARTICIPAÇÃO DE  SÃO FRANCISCO DE ASSIS (02 DE OUTUBRO DE 1923)
A Coluna Revolucionária do Oeste, sob a comandância do Gal. Honório Lemos, perseguidos pelo Gal. Flores da Cunha, transpõem o Rio Ibicui na altura do " Passo do Catarina " ( atual Praia do Catarino ou Jacaquá ) em 29 de setembro de 1923, rumo às Missões. Logo no início da Revolução (março/abril 1923), o Cel. Hortêncio Rodrigues, comandando 300 homens, havia ocupado São Francisco de Assis pacificamente, uma vez que o Intendente Borgista, Dr. Carlos de Oliveira Gomes, ante a impossibilidade de resistir havia se retirado com sua pequena guarnição. Como a Vila voltara ao comando do intendente Dr. Carlos Gomes, pois a tomada pelos libertadores tinha sido apenas simbó1ica, continuando na marcha, a Coluna mandou emissário para que houvesse rendição, o que não foi aceita pelo corajoso intendente, ainda envergonhado pela pecha de medroso que seus próprios companheiros de São Vicente e Santa Maria lhe impingiram, quando de sua retirada estratégica, meses antes. Toda Coluna acampou nas imediações da Vila, na Fazenda de Henrique Gregório Haigert (Nico Bonito), pai do Cel. Pimba, do Cap. João Vergilino Haigert e do Tte. Amarino Haigert, todos revolucionários. 
O emissário da Coluna foi Dedé Ribeiro, o popular Zera, filho de Taurino Ribeiro, proprietários da Telefônica local, que, na altura da localidade de "Apertados", na estrada que leva à Estação Férrea do Jacaquá, no outro lado do Rio Ibicui, no município de Alegrete, estava consertando a rede de fios, quando foi preso pelo revoltosos e se tornou o portador da mensagem de rendição. 
Pela manha de 02 de outubro a Vila estava sitiada pela Coluna Revolucionária de São Francisco de Assis, mais o Coronel João Batista Luzardo, chefe do Estado Maior e ainda o Cel. Trajano e sua pequena força, de Don Pedrito. 
O Gal. Honório Lemos não participou do combate, ficando acampando com o grosso da tropa, aguardando os acontecimentos. Achara, decerto, desnecessário, mesmo que a luta era tipicamente familiar, envolvendo gente da mesma terra, entrelaçada por vínculos sanguíneos e de antigas amizades, agora rompidas na luta de cada um por seus ideais. 
Na madrugada de 02 de outubro, Luzardo e Hortêncio deram a ordem de ataque geral, começando o medonho combate. A investida libertadora foi frontal e suicida. Logo os defensores, postados nas trincheiras, nos altos das casas e nos telhados, fizeram desabar sobre os atacantes uma chuva de fogo que causou várias baixas. O sistema defensivo, que compreendia obstáculos colocados na embocadura das ruas, obrigava os atacantes a investirem pelo meio ou invadirem casas de família para chegarem ao reduto principal, que era a praça da intendência. Batista Luzardo, de espada na mão, comandou a grande investida frontal de cavalaria para chegar até a praça. Logo o cavalo de Luzardo rodou, atingido na cabeça, obrigando o cavaleiro a se abrigar para não ser atingido. Partiu dele a ordem de avançar, e as centenas de homens foram ultrapassando os obstáculos um a um, em meio ao alarido dos defensores, dos gritos das mulheres e das crianças, precariamente abrigadas nas residências invadidas, do gemido dos agonizantes traçados a punhal ou espada, fuzilados ou degolados sem quartel. Já atacados nas ruas, nas esquinas, por detrás dos muros, de dentro das casas, já agora de cima dos telhados, o que restava dos defensores foi obrigado a saltar das trincheiras e procurou abrigo por detrás dos troncos das árvores da praça e no edifício da Intendência. 
Foram entabuladas novas tentativas para a rendição dos governistas quando, segundo voz corrente, um revolucionário, ao apertar os arreios de sua montaria, infelizmente, soltou-a e esta, livre, galopou célere pela rua principal, rumo às trincheiras abertas em todas as bocas das vias de acesso a Praça da Intendência, guarnecidas de provisórios. Os defensores abriram fogo, enganados com o falso movimento. Foi o que bastou para o combate recomeçar ainda mais violento. Um mangote de homens atingiu a Intendência e lá se entrincheirou.
Foram retabuladas as negociações e o Cel. Pimba e o Major Álvaro Alves conseguiram que os defensores se rendessem, sob garantia de vida. Ainda impelido pelo calor do combate e pelo ardor político, o comandante da Coluna Gel. Hortêncio Rodrigues, instigado por alguns companheiros, principalmente pela força de Dom Pedrito que tivera seu chefe tombado, tentou invadir e sacrificar os republicanos recolhidos e já rendidos na Intendência, o que foi contido pelo Cel. Pimba, que se opôs veementemente às ordens de invasão do seu chefe, salvando os vencidos, alguns com ferimentos. 
Pelos governistas, tombaram o Intendente Carlos de Oliveira Gomes enquanto municiava seus comandados nas trincheiras, o Gel. Estevão Brandão, Delegado de Polícia e Ex-Intendente, o corajoso cap. João Manuel Marques, subdelegado, já na frente da Intendência. Pelo lado rebelde tombou o Gel. Trajano de Don Pedrito, além de muitos bravos.

Fonte:
CARNEIRO, Glauco. Luzardo, o último caudilho. Editora Nova Fronteira, 1977.
MARQUES, Antero. Mensagem para poucos: vivências de um estudante revolucionário. A nação, 1964


Tyrteu Rocha Vianna
Tyrteu Rocha Vianna (São Francisco de Assis, Rio Grande do Sul, 28 de novembro de 1898 - Alegrete, 21 de setembro de 1963) foi um poeta de vanguarda, radioamador, e grande proprietário de terras do Rio Grande do Sul, Brasil. Tem sido considerado pela crítica como um dos mais dotados ou o maior dos modernistas do início do século XX no Rio Grande do Sul.


Biografia
Formado em Direito em 1922 pela UFRGS, em Porto Alegre, e tendo sido o 5º radioamador do Brasil, com um rádio construído por ele mesmo, sendo de família abastada, participou daRevolução de 30, seguindo para o Rio de janeiro com Getúlio Vargas, de cuja fazenda em São Francisco de Assis as suas terras eram vizinhas. Fazendo o trabalho de interceptar e traduzir mensagens em outras línguas, ganhou a confiança de Getúlio Vargas, e teria sido convidado para ser embaixador do Brasil no Japão, tendo porém Getúlio desistido da idéia, conforme as fontes encontradas, em função de exageros com bebidas alcoólicas manifestados por parte do poeta durante a estada na então capital do Brasil. Após reveses financeiros, processos judiciais e prisões, viveu em hotéis e passou por momentos de mendicância, vindo a falecer na cidade de Alegrete, onde havia sido amparado por um amigo.

Vida como poeta
Possivelmente o único poeta moderno do extremo sul do Brasil a praticar uma poesia de vanguarda nas primeiras décadas do século XX, seu único livro publicado, Saco de Viagem (1928) tem características formais cubistas e futuristas, além de referências à obra de Oswald de Andrade, explorando também o humor do modernismo brasileiro direcionado, principalmente, à fatos da política local e das cidades vizinhas, bem como neologismos que exploram a linguagem regional do gaúcho.
Tem-se pouca informação a respeito do trabalho do poeta, embora Tyrteu Rocha Vianna fosse publicamente reconhecido como tal, participando de tertulias com amigos em sua cidade. Sua obra futurista e antropófaga "Saco de Viagem", concluída em 1927, surpreende a muitos pelo fato de ter sido criada em uma cidade então muito pequena e com características rurais, em uma época de difícil acesso à informação atualizada, localizada no sudoeste rio-grandense, São Francisco de Assis, a qual foi palco de sangrentos combates na Revolução de 1923. No entanto, o vanguardismo radical de Tyrteu pode explicar-se, possivelmente, por ser ele um pioneiro do radioamadorismo e um poliglota.
O livro foi pago pelos próprios meios do poeta, em 1928, publicado pela Editora Globo, em Porto Alegre. Conforme seu filho adotivo, Oscar Ferreira da Costa, o poeta desejava imprimir somente 10 exemplares, para presentear os seus melhores amigos, crendo que não valia a pena mostrar a obra a muitas pessoas. Informado que o custo seria alto e que a tiragem deveria ser de, no mínimo, 1.000 exemplares, o poeta pagou o preço dos mil exemplares, fazendo imprimir apenas os 10 exemplares desejados, com o nome do amigo que seria presenteado impresso.
Após isso tem-se notícia de um poema publicado no jornal Cadernos do Extremo Sul(Versos para um tordilho chamado Maomé) da cidade de Alegrete em 1957, onde ele foi viver em 1955 na casa de um amigo que era dono de um "bolicho".

A poética de Saco de Viagem e o reconhecimento póstumo do autor
Os poemas de "Saco de Viagem" exploram regionalismos da fala, neologismos e fusões de palavras, fazendo, às vezes, recordar a poesia daquele que é reconhecido como o maior poeta peruano de todos os tempos, César Vallejo, em seu livro "Trilce" (1922). Um certo humor antropófago comparece neles. A estrutura dos poemas é formada por versos que operam por fragmentação e síntese, usando técnica de montagem semelhante às de Eisenstein no cinema, de Oswald de Andrade em poemas de Pau-Brasil e de Blaise Cendrars, em seus poemas mais curtos, e de Maiakovski, em sua fase inicial. Certamente, usa técnicas cubistas, herdadas via futurismo (ver o texto "A tradição anti-futurista", de Apollinaire). Não utilizou-se de grafismos como os futuristas italianos, o que talvez fosse uma impossiblidade tecnológica na época, e isso talvez explique porque uma parte do livro se chame "Vontade de versos futuristas".
É considerado, hoje, um dos mais dotados poetas do modernismo no Rio Grande do Sul. e, segundo Itálico Marcon (poeta, crítico literário, ensaísta e um dos maiores bibliófilos do Brasil), o maior modernista do Rio Grande do Sul, tendo sido a obra de Tyrteu apresentada a ele por Érico Veríssimo, entre outras personalidades.
Por outro lado, mesmo aqueles ensaístas que, como Luís Augusto Fischer o consideram meramente um "modernista regionalista" e opinam que o autor não teria alcançado "excelência", o incluem na lista dos melhores poetas gaúchos do modernismo.
A simples leitura dos poemas de "Saco de viagem", disponível na Internet, poderia responder às dúvidas do leitor.


Nossa Senhora da Candelária do Ibicuí
Por Lisandro Lorenzoni¹

Antes de adentrar ao tema específico deste artigo, se faz necessário situar de maneira superficial, o processo colonizador da Espanha e os principais povos indígenas que habitavam a Província Jesuítica do Paraguai², criada em 1609. O território abrangia o Paraguai, Argentina, Uruguai e os estados brasileiros do Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Importante frisar que a exploração das terras na América espanhola ocorreram por etapas e os povos indígenas sofreram ação direta dos conquistados, com trabalho escravo aos encomenderos³, bandeirantes paulistas ou pela fundação das Reduções Jesuíticos-Guarani.

Os Guarani dominavam uma vasta área territorial, que se estendia do Paraguai até o Rio da Prata. Não habitaram o planalto gaúcho, onde se encontravam os grupos Jê e, nem as planícies/pampa, território dos charruas e minuanos. Segundo dados arqueológicos, a tradição Tupi-Guarani estava presente nas matas subtropicais, que se estendiam ao longo do Rio Uruguai e seus afluentes, além do Rio Jacuí, litoral e suas lagoas. Muitos dos povos indígenas foram guaranizados, ou seja, eram de outros troncos e viviam em pequenas aldeias, mas por poder, alianças ou influência dos Guarani, adotaram seus hábitos e costumes. 


Em um primeiro momento a fundação de Reduções Jesuíticas, criadas através da palavra de Deus, agiram como salvação espiritual e física aos índios, mas seu principal objetivo era demarcar e proteger o território espanhol da potencial expansão dos lusos ao Rio da Prata. Na primeira fase ou ciclo missioneiro em solo gaúcho (1626-1637), foram fundadas 14 reduções e os povoados eram simples, instaurados com o intuito de convertê-los à fé católica, com igrejas construídas de madeira ou de taipa, enquanto as casas dos índios eram de pau-a-pique. Foi na Serra Geral ou região dos Tape (grupo indígena que dominava o Planalto Central, entre as bacias dos Rios Ibicuí e Jacuí), que adentrou o Padre Roque González de Santa Cruz. Aporta pela primeira vez pelos últimos contrafortes a Oeste desta Serra, entre os Rios Ibicuí e Itu, na chamada Coxilha do Boqueirão (Santiago). Na segunda vez, com a ajuda dos índios Tape, comandados por Nenguiru, Roque González partiu da margem esquerda do Rio Uruguai para lançar a semente das futuras Reduções Jesuíticas-Guarani. No dia 3 de maio de 1626 funda São Nicolau do Piratini, entre os Rios Ijuí e Piratini, a primeira redução em solo rio-grandense.

Em 1627, um ano depois do seu primeiro intento, o Padre Roque González chega na confluência entre o Ibicuí com o Uruguai e não encontra nenhum aldeamento de índios em ambas às margens. Decide então subir de canoa cerca de 40 léguas (200 Km) pelo Rio Ibicuí, nas proximidades com a embocadura do seu principal afluente, o Rio Jaguari, onde na margem direita, encontra a aldeia do cacique Tabacã. Sendo bem acolhido pelos indígenas, ali funda a segunda Redução Jesuítica em terras gaúchas, erguendo-se com ajuda dos índios uma cruz de cerca de 40 pés e uma pequena capela feita de pau-a-pique e coberta de palha. Em homenagem a Maria Santíssima, o Padre Roque batiza a redução de Nossa Senhora da Candelária do Ibicuí. A Redução teve duração efêmera, pois quando voltou, Padre Roque foi informado que índios lindeiros ao Ibicuí, destruíram a capela, colocando fogo na cruz. 

Em carta ânua, Padre Roque faz referência ao ocorrido na Candelária do Ibicuí. “Assim que cheguei ao porto, onde havia começado a redução, mandei chamar os caciques vizinhos que logo vieram, entre eles, Tabacã, em cuja aldeia se cometera o sacrilégio e interroguei-o sobre o caso. Responderam-me que era verdade. Censurei-os com severidade, mas ele se desculparam, alegando que aquilo havia acontecido estando eles ausentes e longe dali. Pelo que, sendo grande a multidão de índios malfeitores, podiam cometer a salvo o delito”. O padre decidiu que não mais voltaria aquele lugar e reuniu os caciques dos Tape para conhecer o quão grande era seu território - não à toa o significado de Tape é povoação grande. Mas a Candelária permaneceu como referência geográfica, pois encurtava o trajeto para subir às outras missões, uma vez que bastava subir o Rio Jaguari e atravessar a Cordilheira do Boqueirão. 

O que hoje são terras de São Francisco de Assis também abrigaram a Redução Jesuítica de São Tomé do Ibiquiti, fundada em 13 de junho de 1632, pelo Padre Pedro Romero (superior das reduções do Uruguai), juntamente com os Padres Manuel Bertot e Luís Ernot. Sua localização ficava cerca de 500 metros de onde hoje existe a Gruta de São Tomé, próxima a ERS-241. Foi a primeira Redução Jesuítica da Província do Tape e chegou abrigar 7 mil índios. Em 1638, em virtude dos ataques constantes dos bandeirantes paulistas, os padres e os índios decidiram destruir a redução e migraram para a margem direita do Rio Uruguai, criando uma nova redução onde hoje é a cidade de São Tomé, na Argentina. Os descendentes destes que partiram da Redução de São Tomé deram origem ainda a Redução Jesuítica de São Francisco de Borja (1682), mais tarde município de São Borja. Esta redução foi a primeira do segundo ciclo, considerado a fase de ouro das missões em solo gaúcho. A constante luta entre o encomendero espanhol, o bandeirante luso e o jesuíta espanhol foi uma das causas para a Guerra Guaranítica (1750/1756), quando os exércitos luso e espanhol destruíram as reduções. Em 1768, por ordem do Marquês de Pombal, os jesuítas foram expulsos e gradualmente as reduções foram abandonadas.

Por de fato: a célula mater étnica-cultural e histórica do Rio Grande do Sul se deve em grande parte a criação das Reduções Jesuíticas-Guarani. É o contato dos indígenas com o europeu luso-espanhol e com o negro, o núcleo-primeiro da formação que, a posteriori, dará origem ao homem sul rio-grandense - herança racial idealizada no gaúcho tradicional.


(1). Lisandro Benvegnu Lorenzoni é jornalista, pós-graduado em Leitura, Literatura e Formação e assisense com muito orgulho.
(2). A Província Jesuítica do Paraguai foi desmembrada da Província Jesuítica do Peru. Os jesuítas dividiram-na em quatro Frentes Missionárias: Paraguai, Itatim, Uruguai e Tape.
(3). Espanhóis donos de terra com poder na sociedade colonial. Pagavam tributos à Coroa Espanhola. Os índios eram forçados a trabalhar nas fazendas e lavouras.


Consulta Bibliográfica:
Arquivo Geral da Índias 
Coleção Pedro de Angelis. Arquivo Nacional 
Zuse, Silvana. Os Guarani e a Redução Jesuíta. São Paulo. 2009








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