sexta-feira, 9 de novembro de 2012

O DESAPARECIMENTO DA CATEDRAL MISSIONEIRA DO VERSO XUCRO


Mais um post que copio na integra do blog de Léo Ribeiro, porque estive lá, também, na Timbaúva, na casa onde nasceu Jaime Caetano Braun e assisti essa degradação do Patrimônio Histórico do Rio Grande do Sul. Existe verba para tanta coisa e nossos políticos atiram dinheiro no lixo para se eleger e será que não vai ter nenhum que possa comprar essa propriedade e restaurar, para que não morra um tanto de nossa história? Parabéns Juarez Miranda pela bela iniciativa de trazer a tona um assunto tão pertinente.
        
Texto e imagens do poeta Juarez Miranda (O Xirú)

Caro Parceiro Léo Ribeiro

Há dias estou para te enviar este chasque.

Baseado na tua idéia de aprimorar a forma de avaliação e premiação dos concursos que se realizam por todo este pago, estou tentando adaptar a tua proposta e relacioná-la com um escalonamento específico de valores, não só no sentido de unificar a forma de avaliação, mas, também facilitar a metodologia e consequentemente qualificar a produção deste rico manancial da cultura gaúcha.
Era essa minha intenção primeira, mas aconteceu algo, que por sua relevância, atropelou minhas pretensões.
Acontece que, neste meio tempo, pealaram duas poesias minhas - Lenço Missioneiro e Chinoca Caborteira - na 1ª Seleta da Legendária Bossoroca. Mas Bah!! fiquei mais algariado que chinaredo em liquidação de retrato do Joca Martins e me mandei prá Timbauva e por isso pensei: na volta eu mando pro Léo.
Chegando na terra que foi berço de Jaime Caetano Braum - um dos quatro pilares da Cultura Missioneira, junto com o Noel Guarani, Cenair Maicá e Pedro Ortaça - sentia vibrar no meu ser os versos do Payador, que diz em Prece:

Sinuelo dos tauras, 
Bandeira dos livres, 
Eu sinto que vives 
Flaneando nas almas 
Inspira e acorda 
Com a luz que recorda 
O berço e a origem.

Não me fiz de rogado e como padre que vai a Roma não deixa de ir no Vaticano, dei um jeito de conhecer a casa onde nasceu o Jaime. o que, para mim, é a Catedral Missioneira do Verso Xucro.
Já Conhecia a Lápide em homenagem à Cenair, em Santo Ângelo e a Estátua do Jaime, no acesso a São Luiz Gonzaga.
Fiquei conhecendo o Túmulo-Monumento em homenagem ao Noel e, como disse anteriormente, procurei conhecer o Monumento ao Jaime, que em sua infinita sabedoria, o Arquiteto do Universo, sendo Justo e Perfeito e Sabedor do Ontem, do Hoje e do Amanhã, já, por meio dos homens, projetara.
Ao pisar naquele Santuário, a emoção foi realmente incomensurável.
Era sexta feira, dia dos finados, no meio da tarde. De repente, e não mais que isso, um vento sudeste, insistente e morno começa a varrer as coxilhas e levantar o pó da terra vermelha que se depositara sobre o lajeado, por causa das fortes chuvas da semana passada.
Para me proteger deste surpreendente fenômeno, caminhei em direção da porta, que nesta altura começava a bater fortemente no marco, e num upa estava eu, sobre o chão sagrado daquela morada.
Quando entrei, uma janela de folha arrevezada fazia o vento assobiar.
Até fiquei com uma dúvida: que estranho, eu conheço este assobio e não parece ser do vento.
O tempo foi passando e o tal do vento foi diminuindo, diminuindo, foi ficando num sussurro. De sopetão, recrudesce novamente e do quarto dos fundos, onde o Jaime nascera, eu juro que ouvi, como uma voz que surgia daquelas paredes: e a china, tchê??
Bueno, correu um arrepio que levantou os pelos da paleta até o fim do espinhaço. Me mandei a lá cria e, ainda meio assoleado, sentei num cepo de guajuvira e fiquei na sombra de um frondoso cinamomo sobrinha, que - soube depois - fora um dos que o Jaime plantou na adolescência.
Toda essa emoção me deixara de goela seca e como percebi que havia um poço, ainda mais velho que a casa, resolvi me refrescar e matar a sede.
Vi um monte de telhas e sobre elas, ajoujado a uma lonca de couro cru, uma cambona velha - provavelmente contrabandeada da Argentina por algum chibeiro - pois ainda se podia ler: Aceite Cocinero, Producto Argentino, producción 1947.
Peguei a dita, mandei prá dentro do poço e de lá retirei água fresca para me refrescar e beber. Quando fui botar a tal da cambona no mesmo lugar, senti curiosidade de saber de onde vinham as telhas.
Foi aí que o posteiro me disse: são da casa do Jaime. Então reparei que a casa estava coberta com telhas de amianto.
Na prosa com o peão, ele me explicou que haviam feito a troca no dia anterior, porque uma semana antes havia ventado e chovido muito e começaram a aparecer goteiras, e a dona resolveu o problema trocando a cobertura.
Ao retornar ao CTG Sombra de Carreteiro, comentei com os aparentados e percebi que eles não estavam ao par do acontecido.
Quando cheguei à Porto alegre, rememorando os fatos, foi que me dei conta do que estava acontecendo: A casa do Jaime - Catedral Missioneira do Verso Xucro, prá mim - estava desaparecendo e se algo não fosse feito, o Monumento, certamente inspirado pelo Criador, mesmo antes do Payador nascer, desapareceria.
E, de nada adianta a construção de mausoléus e estátuas, se deixarmos morrer o que ainda resta de original e verdadeiro. É como plantar um belo e florido jacarandá, sem raiz. Ele morre, assim como irá morrer o que ainda resta da Cultura Missioneira.
Ainda é tempo. Todo o material está em volta da casa e talvez se precise de algum esforço para recolocá-lo, mas se todos se unirem acredito que isso seja possível.
Reconheço que a casa é propriedade particular, bem como o terreno em que ela se encontra. Por isso entendo que não temos nenhum direito de meter a mão, mas temos todo o dever de exigir que a memória do Jaime seja respeitada e este respeito, sem dúvida, passa pela preservação das poucas coisas que ainda permanecem quase inteiras.
Para ilustrar o que te disse te envio duas fotos: uma, com as telhas originais, tirada há menos de um mês e a outra, que eu mesmo fotografei no dia 02/11, já com as telhas de amianto.
Se necessitares alguma confirmação, acredito que a patronagem do CTG - Srª. Soeli Antunes e seu esposo Carlos Antunes, (masoeli@hotmail.com) - não te negará, mesmo sendo parentes da atual proprietária a Profª. Ana Tereza.
Bueno, como o chasque tá mais comprido que discurso de gago, vou finalizar. E,sabedor que o teu blog retumba em todos os cantos deste estado, te proponho que, se achares por bem, iniciemos um movimento que grite, para impedir que esta devassa continue e que, se possível, permaneça em pé e sem qualquer descaracterização a Catedral Missioneira do Verso Xucro.

Amigo Léo, será que esta luta vale a pena?

Com Saudações Gaudérias.

Juarez (O Xirù)


Casa de Jayme Caetano com o telhado original - outubro de 2012

Casa de Jayme Caetano com o novo telhado - novembro de 2012

Fonte: blog Léo Ribeiro

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